quinta-feira, 13 de agosto de 2009

BURN AFTER READING




Sei de gente obcecada com nenhures, convencida de uma importância que não tem nem nunca terá, gente paranoicamente consumida pelo estímulo da perseguição, que a toda a hora projecta nos outros os seus mais recalcados vícios, sei de gente que, vista de perto, é como um imenso lago visto da estratosfera, ou seja, nada, gente que se julga mais gente do que na realidade é. Sei de gente que anda sempre à procura de alguma coisa com os olhos no horizonte, gente que olha tanto para a frente que nem repara na merda de cão que pisa enquanto anda, porque é gente que não olha para os próprios pés nem nunca os traz descalços, é gente que passa a vida a tentar olhar o mundo por cima dos ombros de outra gente, arrastando consigo o caos dos equívocos que matam e ferem e deixam cicatrizes impossíveis de sarar. Os departamentos de estado devem rebentar pelas paredes de gente assim, gente que olha para tudo com um terceiro olho e procura no vazio alguma coisa que possa estar cheia, uma coisa que não se sabe bem o quê, gente que paga e despende, gente que desperdiça os dedos sem olhar as unhas, gente com garras de borracha e vestidos de organdi. Os departamentos de estado simpatizam com gente assim. Esta gente é o sexo dos anjos, um sexo murcho e cobarde a agir por antecipação, um orgasmo precoce que não tem escrúpulos na traição porque é gente que desde pequena se trai a si própria. Por alguma coisa, todos queremos alguma coisa. Ansiamos pelo nosso dia, pela hora h, pelo momento de sorte que até aos nascidos sem cu causa excitação. Mas não nos excitemos em demasia. Quando menos esperamos, o que julgávamos grande torna-se pequeno. Nestas coisas é preciso ter o olho da demora. Não vale a pena querer ver a Terra da lua se nem para a vermos dentro da nossa própria casa temos olhos. Pousemos a cabeça sobre a nação. As conspirações apenas nos ensinam que nada temos a aprender.

4 comentários:

jp disse...

A paciência que é preciso para gente assim. Porra!

Anónimo disse...

E porque não?Para quê tanta arrogãncia num ego que é semelhante.

jp disse...

A ironia é uma figura engraçada, principalmente quando a conseguimos aplicar a nós próprios, mesmo que os outros não percebam.
De qualquer forma, as pessoas são sempre muito mais e menos também do que aquilo que parecem.

hmbf disse...

Sendo explícito, o que é sempre uma chatice: o texto é sobre o filme dos irmãos Cohen.