segunda-feira, 10 de maio de 2021

MELANCHOLY MOOD (1958)

 


No spam misturam-se convites para páginas de livros, sites de pornografia, pedidos de amizade, a mesma farinha. «Eu sou uma mulher que precisa de satisfação», assina o bot Mia. Eu sou um homem desapaixonado, respondo-lhe. Perdi o que em mim havia de paixão ao aprender que o amor implica — medo de ser traído, abandonado, deixado sozinho com botões de punho esfarelados. Ser amado sem medo, a incumbência de uma vida. Ou arranjar 15 pseudónimos, como Germain Nouveau, que se amem uns aos outros. O segredo para a felicidade está em não atribuirmos importância ao amor, negá-lo como a sapos feitos príncipes, foder como bestas que satisfazem necessidades muito básicas. Puta que pariu o amor mais as manhãs de Maio a ouvir Horace Silver. Maio invernoso de tardes cinzentas, manhãs de luz esboroada à passagem das horas, céu carregado de nuvens atravessadas por relâmpagos silenciosos, mês de primaveras tristes, funeral de andorinhas enlutadas, as janelas das casas escancaradas para uma chuva estéril, o soalho carente, enegrecido pelos passos amestrados de quem se levanta para ver morrer a alegria de um dia ainda por nascer. Pela manhã, as ruas enchem-se de gente estúpida que parece não perceber estar já morta. Depois regressam a casa fingindo-se vivos. Comentam as notícias com os olhos saturados de realidade, respondem ao spam crendo poder ser essa uma aventura desviante na unissonância dos carris que levam ao tédio. «Ir depressa é morrer mais cedo.» Quem dizia isto? Um francês esquecido, se bem me lembro.

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