terça-feira, 29 de maio de 2018

URBI ET ORBI

Parece haver qualquer coisa de infantil no fascínio que no mundo actual as máquinas exercem junto de um grande número de pessoas. No contexto do industrialismo virtual e do capitalismo internético, a associação da máquina a um brinquedo é quase inevitável. Quando no fim dos anos 90 se propagou urbi et orbi a deslumbrada excitação com um aparelhómetro digital chamado Tamagochi, fabricado por uma empresa japonesa de brinquedos e jogos electrónicos (a quarta mundial deste sector), esse comercial fenómeno de adesão não pôde deixar de surpreender quem o observasse de fora, ao ver a dependência que imediatamente criou entre os «adeptos», adultos e crianças. Este objecto (que em 2017 foi relançado pela mesma empresa, obviamente com belas inovações técnicas e de imaginário) consiste em criar uma ficção compulsiva: cuidar, a tempo e horas, de um «animalzinho», como se ele fosse real - dar-lhe «comida», «bebida», «banho», «carinhos», tudo virtual. Na nova versão, o Tamagochi é vendido «com uma opção de família»: comunicando com outro, pode ter filhos, os quais poderão depois casar, etc. E este novo produto já promoveu «aplicações» graças às quais o usuário (ou deveremos dizer utente?) pode cuidar de um alienígena, entrando assim em contacto com os tão apetecidos mundos extraterrestres para onde os humanos irão, um dia destes, morar e reproduzir-se, quando a Terra estiver finalmente inabitável...

Júlio Henriques, in Humano Aumentado, revista Flauta de Luz, n.º 5, Abril de 2018, pp. 10-11.

2 comentários:

  1. Força camarada. Cá eu, começo a pensar que torno a fumar só para experimentar a irritação de deixar :) Chama-se agonia auto-induzida...

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  2. :-)

    Vou no bom caminho. Anteontem estive em Melides. Lembrei-me de ti.

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