Com vento favorável, mesmo junto aos edifícios dos bancos e do grande escritório, pode sentir-se o cheiro do mar.
Vem do cais, não é absoluto nem abafa as buzinas dos carros. Não leva o perdão aos sonhos dos homens curvados nos arquivos, nem é mesmo vigoroso como pensar de repente na morte, pensar na morte e trincar uma laranja.
Mas com vento favorável boa vontade e raiva pode sentir-se, chega a sentir-se, o cheiro do mar.
Jaime Salazar Sampaio (n. 1925 - m. 2010), in Poemas Propostos (1954). Embora tenha consolidado a sua produção literária essencialmente enquanto dramaturgo, começou por publicar poesia. O fascínio pelas vanguardas reflecte-se nas aproximações tanto à poesia experimental como ao teatro do absurdo. Autor de poemas breves, explorou com rigor as tensões entre o homem e a sociedade do seu tempo. Conseguiu com extrema simplicidade expressar a angústia e frustração do ser exilado em si mesmo, embora consciente da absurdez matricial da existência.
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