sexta-feira, 4 de outubro de 2024

O CRISTO

 

Há um triplo homicídio e logo surge a expressão "onda de crime". A comunicação social, ávida de audiências, transforma a onda num canhão da Nazaré. O Chega surfa o canhão e faz do fenómeno um tsunami. Ora bem, o que torna o triplo homicídio particularmente chocante é a sua excepcionalidade num país como o nosso. O último de que me recordo foi em 2017, o do tal Pedro Dias, português de bem que, como qualquer português de bem, não era imigrante nem cigano nem negro. Não há nenhuma onda de crime, o que há, de facto, é uma disseminação oportunista do sensacionalismo, maná dos populistas que cavalgam o medo e nos minam o espaço mediático com o ódio. Dizem-se todos muito católicos e cristãos. Infelizmente, não praticam os aconselhamentos do senhor Jesus. O Cristo.

DE MÁ CONDIÇÃO

 


Calhou assim, não foi propositado. Chegou-nos ontem, Dia Mundial da Árvore e da Poesia, este segundo volume da Colecção Insónia. O primeiro foi "A Dança das Feridas". Esperámos 13 anos por ele, eu, a Maria João Lopes Fernandes e o Pedro Serpa.
 
Tal como aconteceu no passado, também deste volume não farei apresentações públicas nem distribuição pelas livrarias. Trata-se de uma edição única, minha e da Maria João - autora das pinturas na capa e no interior, originais concebidos para este efeito -, que em nenhuma circunstância deverá ser objecto de qualquer reedição.
 
Quem tiver interesse num exemplar, poderá contactar-nos, a mim ou à Maria João, por Messenger (Facebook, Instagram) ou email. O meu email é fialho.henrique@gmail.com. O valor de capa, com portes incluídos, é 10€. São 78 poemas e 9 reproduções de pinturas da Maria João Lopes Fernandes. O design e a composição é do Pedro Serpa.
 
Em memória de minha mãe, Clarisse Maria Tavares Bento.
 
Saúde.

quinta-feira, 3 de outubro de 2024

SÓ NOS FALTAVA MAIS ESTA

 


Além de poeta, é crítica literária. E foi buscar óptimos exemplos, um que escreveu sobre incestos e padres depravados, outro que lhe deu com o Tristão, amores de perdição e transgressões várias. Quanto a Pessoa, deixei lá na caixa de comentários da jovem estes versos de elevado nível:
 
UM SERRALHEIRO CHAMADO FIALHO
 
Tinha uma chave que (...)
Com ela muita porta abria...
Aqui a história principia.
Tanta porta abriu o Senhor Fialho
Com a tal chave que era caralho
Que a chave alfim se escangalhou
E aqui o conto acabou.
 
1-1909

DOMESTICADORA DE GIRASSÓIS

 


Os 14 contos de Domesticadora de Girassóis, mais extensos do que é habitual neste autor, exploram universos fantasmagóricos com personagens que tentam equilibrar-se entre o real e o imaginário. O que há de anómalo e de paradoxal nas situações recriadas encontra na multiplicidade formal, que vai da ficção narrativa ao poético, da crónica ao drama, do relato autobiográfico à prosa ensaística e ao diário, vias de expressão para seres cuja existência está em permanente conflito com um mundo onde a separação entre caos e ordem perdeu qualquer sentido.

236 páginas
Maio de 2024
 

Venda directa – pedidos para: companhiadasilhas.lda@gmail.com
 
Também disponível 

na Snob: https://www.livrariasnob.pt/product/domesticadora-de-girassois ;





quarta-feira, 2 de outubro de 2024

INCURSÃO INVASIVA

 


Quem é que vai ser o primeiro jornalista português a perguntar ao Paulo Rangel, ao Luís Montenegro, ao Marcelo e afins se é invasão ou acção militar, invasão ou incursão terrestre, invasão ou ataque terrestre acompanhado de pagers atómicos? O Milhazes e o Rogeiro ainda cantam o "Kumbaya, My Lord" na SIC?

terça-feira, 1 de outubro de 2024

NÃO HÁ ESTÔMAGO QUE AGUENTE

 


Israel destrói Gaza, mata indiscriminadamente crianças, velhos, enfermos, mulheres, invade países, coloniza povos, regiões, transforma pagers em explosivos, reduz a ONU e o Direito Internacional a cinzas. E nada, bico calado, paninhos quentes, finge-se que não se viu, não se ouviu, não aconteceu. Como lidar com tamanha hipocrisia? Isto já não tem justificação nenhuma, estamos entregues à nossa sorte. Olhem, divirtam-se enquanto é tempo.

segunda-feira, 30 de setembro de 2024

VEM NO PÚBLICO

"EUA apoiam invasão do sul do Líbano por Israel com mira no Hezbollah". Agora repitam comigo: EUA apoiam invasão do sul do Líbano, EUA apoiam invasão do sul do Líbano por Israel, EUA apoiam invasão, EUA apoiam.

domingo, 29 de setembro de 2024

sábado, 28 de setembro de 2024

KRIS KRISTOFFERSON (1936-2024)

 


Kris Kristofferson (1936-2024). Fica-me na memória como Billy the Kid num western superlativo de Sam Peckinpah: "Duelo na Poeira", título rasca para "Pat Garrett and Billy the Kid" (1973). Bob Dylan, que entra como actor, assinou a banda sonora. É de lá que vem "Knockin' On Heaven's Door", bela canção que os Guns N' Roses conseguiram tornar intragável.

terça-feira, 10 de setembro de 2024

COMUNIDADES CONSUMIDORAS

 

Grande parte dos livros que hoje se publicam jamais viriam a lume se fossem assinados por gente completamente anónima. O que os torna publicáveis é o nome do autor, uma espécie de capital social do apelido, ao qual acrescem as afinidades e simpatias entre uma comunidade consumidora de livros que, não garantindo lucro, pelo menos evite prejuízos. Disse comunidade consumidora, não disse leitora. Intencionalmente.

segunda-feira, 9 de setembro de 2024

ALERTA ÚLTIMA HORA

 
Um dos evadidos de Vale de Judeus foi avistado na Festa do Livro de Belém, outro estava numa bicha para autógrafos na Feira do Livro do Porto, um terceiro foi à Festa do Avante fazer slide, caiu ao rio e andam mergulhadores à sua procura, um quarto adoptou o cão perdido da mulher desaparecida na Murtosa e foi para Espanha escrever um bestseller. O quinto está aqui à minha frente a jogar na raspadinha.

domingo, 8 de setembro de 2024

O LADO MAU DA FORÇA

 

Depois de infinitas horas de contabilidade e balanço no termo dos Jogos Olímpicos, não há uma alma que venha falar desta diferença abissal entre o número de medalhas conseguido pela China e restantes países nos paraolímpicos. A comparação com o principal rival nos Olímpicos, os EUA, é reveladora: a China consegue mais do dobro das medalhas e praticamente o triplo dos ouros. Talvez isto queira dizer alguma coisa em matéria de políticas inclusivas. Com todos os defeitos que o regime chinês possa ter e certamente terá, seria no mínimo razoável estas matérias serem reflectidas em vez de andarmos permanentemente a diabolizar os “inimigos das democracias liberais” (também se tem visto recentemente em França, organizador destes Jogos, qual o significado de democracia nestes tempos que são os nossos).


1 + 1 = 2


 

Dois criminosos à solta. Ambos perigosos.

sábado, 7 de setembro de 2024

CONCORDATA

 
Ainda um dia hei-de conseguir perceber a razão de ser de uma concordata entre a República Portuguesa, que se diz laica, e a Santa Sé. Mais pasmo com a existência de um regime de perdão de penas e amnistia de infracções consequentes de visitas papais. Porque razão a justiça de uma república laica há-de ser em parte determinada por uma viagem que apenas diz respeito aos católicos?

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

A CULPA É DOS COMUNISTAS

 
Esta noite sonhei que o PCP era responsável pelo extermínio dos maias, dos astecas e dos incas. Que tinha levado a cabo o extermínio das tribos ameríndias, infectando-as com cobertores contaminados de sarampo e varicela, explorando-as em minas de ouro e de prata e etc. Sonhei que o PCP largou duas bombas atómicas no Japão, criou a Santa Inquisição com os seus manuais de 1001 técnicas de torturar infiéis, promoveu as cruzadas, colonizou terras africanas. Esta noite sonhei que o PCP tinha uma frota de navios para o tráfico negreiro, comercializava pretos como se fossem gado, tinha agências de viagens especialmente vocacionadas para o turismo sexual. Esta noite sonhei que o Joe Berardo era do PCP, o Luís Filipe Vieira era do PCP, o José Sócrates era do PCP, Ricardo Salgado era do PCP, José de Oliveira Costa era do PCP, João Rendeiro era do PCP. E sonhei que decorriam inquéritos para apurar centenas, milhares de abusos sexuais nos Centros de Trabalho do PCP. Esta noite sonhei que os fundamentalistas da Al-Qaeda e o Daesh tinham sido apoiados e treinados pelo PCP, ou de algum modo se tinham fortalecido após políticas externas do PCP. No meu sonho, o PCP detinha a indústria petrolífera mundial e estava na direcção da National Rifle Association of America, dominando o negócio global das armas e a chamada economia global de guerra. Enfim, no meu sonho o PCP era a encarnação de todas estas coisas e outras como estas. Depois acordei, respirei fundo e olhei para a EP que repousa na mesa de cabeceira. Respirei fundo, a sonhar com o momento em que voltarei à Festa do Avante.

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

terça-feira, 3 de setembro de 2024

UM POEMA DE RICARDO TIAGO MOURA

 

Tanto quanto se sabe, Ricardo Tiago Moura (1978) estreou-se com “Um gato para dois” (2013). Desde então, tem publicado vários livros reveladores de uma poesia fortemente influenciada por soluções formais amadurecidas no terreno da denominada poesia experimental. Ainda que o lirismo não tenha sido radicalmente rasurado nesta poesia, ele surge-nos como que numa posição de subalternidade face à experiência lexical, sintática, formal. “Comunidade – Comunicante” (não (edições), Março de 2024), editado numa “chancela heterogénea dedicada a livros singulares”, não é excepção. Trata-se de um “dois em um”, colectânea de dispersos que se desvia do formato convencional desse tipo de livros almejando um equilíbrio incomum. A parte intitulada “Comunidade” é especialmente cativante, com os títulos dos poemas a assumirem a forma de didascálicas naquilo a que podemos dar o nome de poema dramático, uma espécie de peça coral para personagens tipo oriundas do métier literário e artístico. Além dos poemas, este livro oferece-nos igualmente um conjunto de colagens. São estas, por assim dizer, a cenografia onde as vozes do poeta, da escritora, do autore, da investigadora, do crítico, da artista, da gestora cultural, do editor, da curadora, do ficcionista, enfim, de «uma comunidade / de gente que pretende / e se protege / pertencendo», vêm à cena dizer de sua justiça, num processo quase invariavelmente de recusa ou problematização do seu estatuto enquanto personas. A dispersão, mais evidente na parte com o título “Comunicante”, logra, ainda assim, um equilíbrio temático que confere ao conjunto uma linha de pensamento inequívoca, problematizando a relação leitor/lido, espectador/autor, «autor-leitor abraçados». Um poema:
 
(cruz-vermelha)
 
é urgente:
não precipitar
não chegar
ao fim
da rua a desaprender a trote
as compras ou as horas
não precisam de sarcasmo
oportunamente a explicar
mas assentam nele tão bem
em todos os espaços do meio
 
e não escrevo isto com motivos
porque fácil é amar
uma ponte um resquício
de ontem
mas bonito é gostar
de bairros sociáveis
aceitar
foder rápido
em várias periferias
 
é urgente:
não comunicar
contracopular
ler o que diz
a fome
que digo eu
falo de cor
 
Ricardo Tiago Moura, in Comunidade – Comunicante, não (edições), Março de 2024, s/p.