O SERMÃO DO CAMELO, 1974
Prometeram-me um pote de mel puro
era eu trocista e imponente
estavam à minha frente
de mão estendida para ocidente
eu disse
às aves de areia
sílabas do meu canto:
mudem de cor e sigam-me
saímos do deserto
por um pouco de mel e de luz
o tempo passará
sem tocar nas
vossas asas
o dia será azul
tal como na lenda
eis a minha palavra
o nosso destino
sigamos em frente
sem esperar pelo
vento
feridas saradas
aprendi
que mãos febris
detêm o sol nas alturas dos penedos
os olhos das crianças
sangram ao amanhecer
entrançam o cabelo
na lama
seca de Setembro
entendeis vós este canto
é o chamado canto das dunas
longe das cidades tranquilas
eles dançam
o pássaro abre as nuvens
que libertam mãos mortas
nós nascemos
com as escrituras à frente
a nossa estrela
fica uma vez por ano
nua no horizonte
subleva a terra
no dia terno
e vertiginoso
Tahar Ben Jelloun (1947) nasceu na cidade de Fez,
Marrocos. Romancista, ensaísta, pintor, poeta, ganhou o Prémio Goncourt em
1987. Chegou a estudar Filosofia na Universidade Mohamed V em Rabat, mas viu os
estudos interrompidos quando foi enviado para um campo disciplinar do exército,
em 1966, por participação em manifestações proibidas. Foi no campo
que escreveu, às escondidas, os primeiros poemas, um deles publicado na revista
“Souffles” em 1968. O primeiro livro surgirá em 1970 com o título “Hommes sous
linceul de silence”. Mudado para França, concluiu doutoramento em psiquiatria,
foi colaborador do Le Monde, do El País, do Corriere della Sera. Tem obras adaptadas para teatro por Michel Raffaelli, assim
como estudos sobre Genet e Beckett. Autor de vasta e multipremiada obra, é um dos escritores mais
traduzidos do mundo. Em 2011, foi
distinguido com o Prémio da Paz Erich Maria Remarque pela defesa da tolerância
e da integração na sua obra. Para a infância, escreveu livros sobre
islamofobia na sequência dos atentados de 11 de Setembro de 2001, nos EUA, a
após os atentados de 13 de Novembro de 2015, na França. O poema aqui divulgado
foi incluído na “Anthologie de la Poesie Marrocaine d’expression française”,
organizada por Jean-Pierre Koffel para as Éditions Aïni Bennaï, 2006, pp. 31-32.
Versão de HMBF.
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