sábado, 13 de julho de 2024

TRÊS SÉCULOS E MEIO

 


Passados 356 anos, constatamos que as palavras de Molière continuam a produzir o seu efeito. As pessoas riem, incomodam-se, gargalham ou ficam com vontade de saltar para a cena porque têm a solução para os problemas que diante delas se (des)enrolam. Tem piada sentir as reacções do público depois de ver o trabalho que foi, que é, que continuará a ser. Parabéns ao Fernando Mora Ramos, que com este Molière se estreou na encenação e a ele regressou agora, 45 anos depois, para nos oferecer um objecto especial. Ouvi de tudo, que Patego tem o que merece, que é um palerma, outros com pena do corno condenam Angélica, a que merece destes compreensão e naqueles inspira raiva. Pelo Perdigoto têm todos empatia, é a prova de que o patrão carrega uma besta dentro de si. Merece castigo. Manhoso é puro gag, o povo adora tolos porque se acha superior a eles. Com Claudina, a empregada, a empatia não é do mesmo tipo, tem momentos de impertinência que um povo católico como o nosso não aprova. Era o que mais faltava, uma empregada faltar ao respeito ao patrão. Clitandro merece compreensão, a despeito da insídia. É o galã que não se desdenha. E os Vilar de Tolos, na sua ruína saloia, o que inspiram nesta terra? Talvez algum tipo de identificação. Para mim, são terríveis. São eles o rosto da hipocrisia que nos governa. Aproveitam-se do genro corno e condenam à infelicidade uma filha a quem não resta senão ser infiel. Parabéns aos actores, que contribuem para que possamos pensar estas coisas sem chegar a certezas. 356 anos depois, Patego, Dandin no original, continua a fazer sentido. Deve ser a isto que se dá o epíteto de génio.

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