(…)
Oh help
me — listen to me — please — please —
turns out I rounded up
these Palestinian refugees —
shot all the young men
against a wall
then the next day
couldn’t remember anything about it at all!
Not only that but when
I clicked on the news
they were saying I’d
massacred over six million Jews!
burned whole forests! —
broke faith! — spat at the poor! —
trashed the planet —
started an endless illegal war
PLUS I AVOIDED TAX!!!
(…)
Martin Crimp, in “In
the Republic of Happiness”, Faber and Faber, p. 64, 2012.
Uma sátira da vida moderna com ressonâncias formais d’ “A Divina
Comédia”, de Dante, citada em epígrafe na terceira parte. Comecemos pelo
Inferno, as relações familiares plasmadas num jantar de Natal caótico.
Lembramo-nos de “A Festa”, de Thomas Vinterberg, ainda que no caso presente as
atenções não estejam inteiramente voltadas para o patriarca. Pai, mãe, duas
filhas, uma delas grávida de pai desconhecido, avô demente, avó, e a visita
inesperada do tio e da tia. Começamos logo bem, com a “Destruição da Família”
enquanto refúgio contra a solidão, lugar de protecção, fonte principal de
felicidade. Ou seja, a destruição de uma concepção conservadora e tradicional
da instituição familiar. Segue-se o Purgatório, com as “Cinco Liberdades
Essenciais do Indivíduo”: 1. A liberdade de escrever o guião da nossa própria
vida; 2. A liberdade de afastar as pernas (nada de político); 3. A liberdade de
experimentar traumas horríveis; 4. A liberdade de abandonar tudo e seguir em frente;
5. A liberdade de parecer bem e viver para sempre. Parece o título de um livro
de auto-ajuda, com as suas respectivas cinco secções de aconselhamento
familiar. Entram em campo os psicólogos, a terapia de casal, os conselheiros conjugais.
O fio narrativo foi à vida, estamos na chaise longue do consultório, na clínica
do psiquiatra, no confessionário. As personagens foram estilhaçadas e ouvimos
apenas um coro de auto-obsessões, sonhos delirantes, fixações, frustrações,
lugares-comuns e ideias feitas de um mundo submetido à tirania do eu, o eu
belo, o eu bem, o eu deslumbrante, o eu do sucesso. Por fim, no Paraíso, isto
é, “Na República da Felicidade”, o tio Bob e a mulher, Madeleine, são Dante e
Beatrice sem ideologia nem misticismo. Há canções pelo meio. No topo, a
estrofe de uma delas.
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