Numa breve passagem por Coimbra, com a Alma Sem Cura do
Jorge Aguiar Oliveira por objecto, vasculhei as estantes do Miguel de Carvalho
em busca de esmeraldas perdidas. Regressei a casa com um saco de plástico
carregado de tesouros. Folheadas as obras, detém-se-me o espanto num volume
intitulado Bone Lonely (Steidl, 2011) com fotografias de Paulo Nozolino e poemas de
Rui Baião. Magnífico objecto sobre o qual talvez ainda venha a partilhar uma ou
duas ideias. Por ora, pretendo apenas partilhar outro espanto. A constatação de
uma abundância sobre a qual talvez já fosse merecida uma análise
sociológico-literária. Refiro-me à profusão de poetisas vindas a lume nos
últimos anos. Assim de súbito, e por certo com lapsos de memória sobre os quais
responderá a ressaca, surgem-me nomes tais como Ana Salomé (n. 1982), Beatriz
Hierro Lopes (n. 1985), Cláudia R. Sampaio (n. 1981), Catarina Nunes de Almeida
(n. 1982), Filipa Leal (n. 1979), Golgona Anghel (n. 1979), Inês Dias (n. ?), Inês
Fonseca Santos (n. 1979), Joana Serrado (n. 1979), Júlia de Carvalho Hansen (n.
1984), Margarida Vale de Gato (n. 1973), Margarida Ferra (n. 1977), Marta
Chaves (n. ?), Matilde Campilho (n. 1982), Patrícia Baltazar (n. 1977), Rosalina
Marshall (n. 1976), Renata Correia Botelho (n. 1977), Raquel Nobre Guerra (n.
1979), Sara M. Felício (n. 1984), Susana Araújo (n. ?), Tatiana Faia (n. 1986).
Como em tudo na vida, mais tarde ou mais cedo seremos obrigados a separar o
trigo do joio. É impossível à memória, por maior que seja a sua generosidade,
conservar tamanha colheita no celeiro da literatura. A dificuldade será
acompanhar toda esta constelação com distanciamento crítico, tentar entender o
que há de verdadeiramente poético em cada uma das obras desenvolvidas.
Impressiona a vitalidade, sobretudo quando olhamos para a história da
literatura portuguesa e o desequilíbrio entre poetas e poetisas é aflitivo. Razões
culturais e sociológicas explicarão esse desequilíbrio, como agora explicarão
um aparente reequilíbrio. Não podemos é deixar de sublinhar o boom, por vezes
acompanhado de incompreensível sobreexposição mediática com consequências
nefastas para uma promoção sóbria e honesta da poesia.
4 comentários:
Eis algo digno de nota e que, estranhamente, ainda não tinha visto ser notado. A nossa literatura e especialmente a poesia, tem sido paupérrima em autoras femininas. Espero que esta nova tendência venha para ficar.
É com agrado que leio esta sua constatação, porque já me tinha perguntado sobre o motivo desta aparente dispersão, senão apagamento, das mulheres no mundo da poesia. Registo, igualmente com agrado,o uso do termo "poetisa"que, também ele,anda a ser abusvivamente substituído por poeta.
Célia, usei o termo poetisa com muita relutância. Grandes poetisas portuguesas detestavam ser assim tratadas, preferindo a forma universal poetas.
Eu sei, hmbf. :-) Entre elas Sophia de M. B.Andresen.Se refletirmos um pouco e aliarmos a reflexão à sua constatação será que não obteremos uma parte da justificação? A literatura não tem género e nunca alinhei na escrita feminina e escrita masculina. Por essa ordem de ideias, poderemos passar a usar a forma invariável "escritor"! O mundo já é gramaticalmente tão masculinizado...que contamina já o léxico?
:-)
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