Não é de todo por acaso que a poesia dos pequenos círculos, nos seus esforços para vencer a sua solidão, mergulha no romantismo insípido do «cosmismo». A ideia é um pouco esta: é preciso sentir o mundo como unidade e nós próprios como uma parte activa dessa unidade, com a perspectiva, mais tarde, de dirigir não apenas a terra, mas todo o cosmos. Tudo isso, bem entendido, é realmente soberbo e terrivelmente edificante. Éramos simples habitantes de Koursk ou de Kalouga, conquistamos toda a Rússia e caminhamos agora para a revolução mundial. Deveremos contentar-nos com tais «limites planetários»? Coloquemos imediatamente o círculo proletário sobre o cume do universo. Que existe aí de mais simples? Sabemos fazê-lo e não receamos ninguém!
O cosmismo parece, ou pode parecer, extremamente audacioso, forte, revolucionário, proletário. De facto, encontra-se no cosmismo os elementos que confinam com a deserção: escapa-se aos difíceis problemas terrenos — e que são particularmente graves nas esferas interestelares. Por isso, o cosmismo revela um parentesco de certo modo inesperado com o misticismo. Com efeito, querer introduzir na sua concepção artística do Mundo o reino das estrelas, e não apenas d eum modo contemplativo, mas de uma forma activa, isso é uma tarefa demasiado pesada, independentemente até dos conhecimentos que se possam ter de astronomia — e, em todo o caso, revela também uma urgência que se não impõe... E compreende-se finalmente que se os poetas se tornam «cosmistas», isso não é porque a população da Via Láctea bate insistentemente à sua porta e exige deles uma resposta, mas porque os problemas terrenos os incitam a tentar salvar o Mundo. No entanto, não basta intitular-se «cosmista» para compreender as estrelas no céu. Tanto mais que o universo é composto muito mais pelo vazio estelar do que pelas estrelas. Esta tendência duvidosa que têm para preencher as lacunas da sua concepção do Mundo e da sua visão artística pela matéria subtil dos espaços interestelares corre o risco de conduzir alguns dos «cosmistas» para a mais subtil das matérias, o Espírito Santo, no qual repousam já tranquilamente muitos poetas defuntos.
Léon Trotski, in Literatura e Revolução, trad.
Serafim Ferreira, Editorial Fronteira, Dezembro de 1976, pp. 93-94.
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