domingo, 27 de agosto de 2017

GUN THE MAN DOWN (1956)

Referi-me anteriormente a dois filmes de Andrew V. McLaglen (n. 1920 – m. 2014), ambos da década de 1960, ambos com o lendário James Stewart como protagonista. O drama familiar Shenandoah (1965) e a comédia romântica The Rare Breed (1966) são, cada qual pelas suas razões, dois westerns a destacar numa filmografia maioritariamente dedicada a esse género. Mas McLaglen estreou-se ainda na década de 1950. Gun the Man Down (1956) foi o segundo filme que assinou enquanto realizador, o primeiro western depois de um estágio dignificante como assistente do mestre dos mestres John Ford. Para o efeito, requisitou um leque de actores que ou viriam a tornar-se emblemáticos ou já o eram por circunstâncias diversas. 
A actriz Angie Dickinson, aqui no seu primeiro papel relevante para cinema, viria a estrelar em Rio Bravo (1959), de Howard Hawks (n. 1896 – m. 1977), ao lado de John Wayne e de Dean Martin. James Arness, o herói de Gun the Man Down, ganhou fama neste filme como personagem do Velho Oeste, vindo a conquistar o importante papel de Marshal Matt Dillon em mais de 600 episódios da famosa série Gunsmoke. O actor Emile Meyer, no papel de sheriff, já tinha conquistado um lugar na história do western com participações em Man with the Gun/Sozinho Contra a Cidade (1955), Drums Across the River/Tambores ao Longe (1954) e no incontornável Shane (1953). Robert J. Wilke, o mau da fita, tinha integrado o elenco de High Noon/O Comboio Apitou Três Vezes (1952) e Harry Carey Jr. era à época um experiente actor com papéis em westerns eternos tais como The Searchers/A Desaparecida (1956), Rio Grande (1950) e Wagon Master/ACaravana Perdida (1950), todos com a assinatura de John Ford.


A primeira cena de Gun The Man Down, ainda anterior aos créditos de abertura, coloca em cena três homens e uma mulher. Eles alinham a táctica para o assalto a um banco enquanto ela os observa. No final da sequência, ficam dentro de casa apenas um dos homens e a mulher. Ele é James Arness, ela é Angie Dickinson. Estão apaixonados, abraçam-se e prometem-se um futuro melhor. O assalto será como que o financiamento possível para uma vida respeitável. Sucede que no decorrer do assalto, que não nos é dado ver (para quê?), ele regressa ferido. E ela acaba por abandoná-lo moribundo, fugindo com os outros dois elementos do grupo. Assim começa uma clássica história de traição, previsivelmente transformada numa tradicional história de vingança. O moribundo é capturado e condenado a um ano de prisão, sem denunciar os seus comparsas na determinação de que será ele a vingar-se no futuro. Assim seja. Paralelamente a essa narrativa algo previsível, de um moralismo típico que faz equivaler a traição à cobardia, temos a figura carismática do Sheriff Morton, interpretado por Emile Meyer, e do Deputy Lee, desempenhado por Harry Carey, Jr. 



Estes dois experientes actores acabam por ser a mais interessante parelha de um western iniciático. A voz da consciência é acompanhada nessa dupla pela experiência, nomeadamente a do Sheriff Morton. Ele distancia-se dos acontecimentos colocando-se no lugar de observador. Não interfere senão por mensagens subtis que demarcam o campo de acção, os limites da paciência e da tolerância. Deixa os acontecimentos correrem, mas com ponderação. Dá-nos a segurança de que domina as circunstâncias por antever nos actos as consequências. No duelo final, senta-se à sombra de uns arbustos a fumar um cigarro. A impaciência do assistente contrasta com a sua serenidade. E esta serenidade é exactamente o oposto da cobardia dos traidores, os quais se mostram precipitados e, por isso mesmo, a cada passo que dão mais se aproximam de um precipício fatal. O Sheriff Morton é um figurão discreto, nada tem que ver com o mito do sheriff implacável e intolerante, de uma coragem hiperbólica ou cativo da corrupção local. É um homem tão isolado nos seus métodos como o jovem Rem Anderson nos seus propósitos. Rem Anderson, a personagem de James Arness, é o moribundo renascido das cinzas com a intenção de se vingar. A intenção será satisfeita, mas desta feita sem trair a lei. Nele, a vingança será em legítima defesa. O Sheriff Morton compreende-o desde o início, sem juízos precipitados nem condenações irreflectidas. A distância e a observação oferecem-lhe essa capacidade. Ver no escuro não é função para qualquer animal. 

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