Trago das férias uma proposta turística: mudar o nome da Costa
Vicentina para Parque Natural dos Selvagens Chique. Com a proliferação de
escolas de surf a desafiarem a nossa inteligência, tornou-se quase impossível
entrar no mar para um simples mergulho sem dar pelo menos três porradas em
pranchas desse desporto que, julgava eu, se praticava com ondas. Vistos do alto
da falésia, os tipos com a indumentária neopreno parecem melgas a boiar em
águas mortas. Encontrarem ondas surfáveis em algumas daquelas praias será tão
provável como virem a ganhar o Euromilhões. O mais que poderão almejar é uma
fotografia ridícula para partilharem no Instagram, enquanto mães, namoradas,
tias, primos, ocupam o que sobra de areal com as objectivas e os telemóveis e
os tablets apontados para o mar.
No intervalo das águas mortas, havendo café por perto, pagam-se
7€ por uma caipirinha ou 4€ por um café e uma água ou 2€ por uma mini enquanto
o tipo das bolas de Berlim percorre a costa com longos pregões: olha a Bola de
Berlim com creme, sem creme, de alfarroba, com Nutella ou chocolate. Perguntei
a um se tinha pagamento por multibanco, respondeu-me que não. Mas sugeriu-me a adesão ao cartão de cliente. À décima bola, teria direito a uma bolacha
americana. Com Multibanco só me safei na miúda dos tererés e das pulseiras com
conchinhas, uma neo-hippie com unhas de gel onde sorridentes rostos de panda olhavam
para mim como se me quisessem devorar.
Começa a ser raro e difícil encontrar praias por aqueles
lugares, praias sem banhistas, apenas com tipos e tipas que apreciem mar,
rocha, areia e mordidelas de mosquito, que não careçam de raquetes nem de
futebóis nem se armem ao pingarelho com pranchas enterradas na areia. Praias
que admitam caniches e outras espécies caninas desde que devidamente vacinadas.
Com a paisagem neste estado, como pode depois alguém aguentar pacientemente
quatro horas para ser atendido num restaurante tão barulhento que mais parece
uma tasca na Feira de Agricultura de Santarém?
Este novo conceito de Selvagem Chique, já instalado, mas
indevidamente explorado, aguarda certos desenvolvimentos. Algumas ideias:
tendas de campismo com ar condicionado; carrinhas pães de forma com acesso ilimitado
a Internet e plasma que permita assistir condignamente a tudo o que é série no
Netflix; venda de cerveja em mochila nas praias; acrescentar a opção Donuts às
Bolas de Berlim, assim como pacotinhos de bolachas Oreo (as crianças estão cada
vez mais exigentes na sua dieta alimentar); espalhar mosquiteiros pelos areais e
colunas de som nas arribas, oferecendo aos banhistas o conforto de uma piscina
de Hotel cinco estrelas; aditar às tendas de massagem tailandesa, ou coisa que
se pareça, áreas de jacuzzi com banheiras de hidromassagem; nas praias pouco
areadas, pavimentar com piso flutuante para que os seixos não magoem pezinhos
lanudos.
Há todo um conjunto variado de alternativas que poderão
cativar um turismo cada vez mais exigente. Recordemos que os freaks há muito deixaram de ser meros freaks, com a evolução dos tempos foram promovidos a
freaks burgueses habituados a todo um estilo de vida muito mais sofisticado. A
Natureza é bela até fazer a terra tremer ou, vá lá, até nos picar com ferrões
de abelhas. A este propósito, muito importante rever o conceito de trilhos
assinalados para percursos pedestres. Não se admite que nos tempos que correm
estes trilhos não sejam devidamente acompanhados de áreas de serviço, pelo
menos, de 300 em 300 metros. Os terrenos pouco ou nada debastados também não
ajudam, sendo a proliferação de vegetação um factor claramente dissuasor da
caminhada.
Por fim, é absolutamente fulcral que a política de arrendamento nestas zonas seja revista. Não se admite a continuada e reiterada propaganda de montes e alvéolos onde proliferam aranhiços, moscas e vacarias nas proximidades. Para não falar de grilos ensurdecedores e de formigas assassinas. Casas sem refrigeração central em pleno Verão são um insulto ao turismo selvagem chique em pleno século XXI, ainda para mais tendo em conta as dificuldades de acesso a Internet que obrigam as pessoas a falar umas com as outras quando poderiam distrair-se a actualizar perfis de Facebook. O Selvagem Chique é um novo turista exigente nos seus propósitos e qualificado nas suas atitudes, obriga a uma oferta sofisticada e atenta. Não podemos perder tamanha oportunidade para a economia nacional. Demos os primeiros passos na direcção de um objectivo para o qual ainda nos falta uma longa caminhada. Tenhamos ânimo, ergamos os pareos.
Por fim, é absolutamente fulcral que a política de arrendamento nestas zonas seja revista. Não se admite a continuada e reiterada propaganda de montes e alvéolos onde proliferam aranhiços, moscas e vacarias nas proximidades. Para não falar de grilos ensurdecedores e de formigas assassinas. Casas sem refrigeração central em pleno Verão são um insulto ao turismo selvagem chique em pleno século XXI, ainda para mais tendo em conta as dificuldades de acesso a Internet que obrigam as pessoas a falar umas com as outras quando poderiam distrair-se a actualizar perfis de Facebook. O Selvagem Chique é um novo turista exigente nos seus propósitos e qualificado nas suas atitudes, obriga a uma oferta sofisticada e atenta. Não podemos perder tamanha oportunidade para a economia nacional. Demos os primeiros passos na direcção de um objectivo para o qual ainda nos falta uma longa caminhada. Tenhamos ânimo, ergamos os pareos.
6 comentários:
resumindo: nem nas férias te deram descanso. :(
Tenho os meus pontos de fuga. :-)
tão bom <3
ah, se não os houvesse!... fica bem. :)
Aqui bem perto há um oeste bem convidativo. Praias fabulosas e inexploradas. Parti à descoberta e estou rendida. Para quê ir tão longe? MF
Pedro, forte abraço.
MF, obrigado pela sugestão. Beijinho.
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