o pobre butch butchanam passou os últimos anos
a tratar de um pombo cego e sem querer ver ninguém
solidário para com o pássaro que amava e tratava
e que por vezes batia asas ao seu ombro deixando cair
um som doce a laranjas azuis girando no céu
a demónios de pé sobre um rato
a macacos de pedra surpreendidos durante o acto
«ó pombo» dizia butch butchanam «amas a cegueira
e eu converti meu coração em cegueira
para que voes ao seu redor e fiques»
mas o que tem de desaparecer
tudo quanto se mastiga come chupa bebe ou saboreia,
chegava com o crepúsculo e tristeza para butch
tristeza para butch.
o qual:
sonhava com desertos semeados com caveiras de vaca
castelos de areia instantânea ou poalha aquietada na
terra
vagas (serpenteantes) de tempo em Melody Spring
e antepassados que já não conheciam nem dor nem dores de
morte
e falavam um idioma lento amarelo feliz
como um laço dourado ao pescoço
noites e mais noites sonhou butch butchanam
até saber que ia morrer
voltou a cama para sul e acomodou-se indiferente ao céu
e deixou escrito no pombo que o enterrassem de costas
para o céu
e aqui jaz de costas para o céu observando tudo quanto
sobe e desce
em Melody terra de desgraçados que:
degolaram o pombo assaram-no e comeram-no
comprovando com horror cristão
que os observava do prato
com a memória dos seus olhos
Juan Gelman, versão de HMBF a partir do original coligido
por Marta Ferrari, in Antología – La poesia del signo XX en Argentina,
vol. 7 da colecção La Estafeta del Viento, dirigida por Luis García
Montero e Jesús García Sánchez, Visor Libros, 2010, p. 304-305.
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