A maioria? Quando Telémaco
saltou para a arena a fim de travar uma luta entre gladiadores, a maioria
apedrejou-o até à morte porque pretendia assistir ao espectáculo. A maioria
libertou Barrabás e condenou Jesus. A maioria estava na multidão que arrastou Hipácia
pelas ruas, humilhando-a, espancando-a, esquartejando-a, antes de deitarem à
fogueira o que dela sobrava. A maioria
esteve com as cruzadas contra os ímpios, sujeitos aos argumentos da fé que
tanto podiam entrar pelo cu, em forma de gancho, como por qualquer
outra parte do corpo crivada de pregos. Os torniquetes foram, durante séculos,
argumentos da maioria, multidão de castigadores entusiasmados com a tortura dos
chicotes. A maioria obedece aos
Agora chamam-se contratados.
Em Itália, há séculos, chamavam-se condottieri. Eram alugados para matar, e condotta era o nome de contrato.
Paolo Uccello pintou estes guerreiros tão elegantemente vestidos e com movimentos tão graciosos que os seus quadros mais parecem passagens de modelos do que sangrentas batalhas.
Mas os condottieri eram homens de barba rija, que não tinham medo de nada, excepto da paz.
Nos seus verdes anos, o duque Francesco Sforza fora do ofício; e não se esquecia disso.
Uma tarde, passeava o duque pelos arredores de Milão, montado no seu cavalo, e atirou uma moeda a um mendigo.
O mendigo desejou-lhe o melhor:
— Que a paz esteja contigo.
— A paz?
Um golpe de espada arrancou-lhe a moeda da mão.
Portanto, há que desconfiar das
maiorias formadas pelo medo e apoiadas no terror. A história dos mercenários é
contada por Eduardo Galeano, in Espelhos – Uma História Quase Universal, tradução
de Helena Pitta, Antígona, 1.ª edição, Junho de 2018, p. 119. O quadro é de
Paolo Uccello.
MERCENÁRIOS
Em Itália, há séculos, chamavam-se condottieri. Eram alugados para matar, e condotta era o nome de contrato.
Paolo Uccello pintou estes guerreiros tão elegantemente vestidos e com movimentos tão graciosos que os seus quadros mais parecem passagens de modelos do que sangrentas batalhas.
Mas os condottieri eram homens de barba rija, que não tinham medo de nada, excepto da paz.
Nos seus verdes anos, o duque Francesco Sforza fora do ofício; e não se esquecia disso.
Uma tarde, passeava o duque pelos arredores de Milão, montado no seu cavalo, e atirou uma moeda a um mendigo.
O mendigo desejou-lhe o melhor:
— Que a paz esteja contigo.
— A paz?
Um golpe de espada arrancou-lhe a moeda da mão.
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