quarta-feira, 5 de julho de 2023

CHARLES ALGERNON SWINBURNE

 


No domínio do Amor os contrários não estão nunca desenhados; ficam sempre por definir e por destrinçar. Charles Algernon Swinburne, por certo um dos outros a que Cesariny alude ao fechar parêntese, participou na irmandade dos pré-rafaelitas, empenhou-se com ela e nela na redescoberta dos primitivos, que acabou no caso dele por se traduzir na libertação dum delírio erótico invulgar. O poeta, além da homossexualidade, assumiu a bestialidade - fazia amor com animais sem peias de nenhuma espécie. Maupassant, que o visitou em 1875, encontrou-o a viver com um adolescente, Powell, filho de Lord britânico, no meio dalguns símios a quem os dois masturbavam de contínuo. O mais surpreendente não é todavia a zoofilia do poeta. O mais tocante é que Swinburne, além de génio verbal, fazia a vez dum pobre homem, de baixa estatura, sempre a tremular, que não parecia pedir da vida senão uma inocência em tudo idêntica à dos seus pacíficos símios, mongolóide e parva. Quem pode acusar um mamífero de promiscuidade - parecia ele dizer, a tremer, com os olhos miúdos, no meio dos animais. Um homenzinho de gravata azul-cobalto, finura sacudida por esticões nervosos assim o viu António Barahona no retrato que dele deixou em Viajante Oxalá (1986). Para mim é, ou poder ser, o tolinho vicentino, boçal e bestial, que passa a perna a todos os presunçosos civilizados e muito untados de indulgências várias que vão às barcas. 

António Cândido Franco, in Cinco Cartas, Editora Licorne, Outubro de 2013, p. 24.

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