segunda-feira, 20 de novembro de 2023

UM POEMA DE OLALLA CASTRO

 


USHUAIA
 
Os turistas que chegam a Ushuaia
sobem ao Comboio do Fim do Mundo,
colocam os auriculares
e primem um botão até darem com a sua língua.
O folheto promete que quem pague bilhete
ouvirá a história dos presos
que construíram a cidade
e poderá deliciar-se com paisagens belíssimas.
Ninguém falará de trabalho forçado,
ou mencionará grilhões, ditadura, repressão.
No final do percurso
os passageiros poderão comprar um postal
onde se vêem os reclusos,
com uniformes às riscas,
a cavar no meio da neve.
Ao fundo haverá um quiosque onde se vendem
café com chocolate e bolachas.
 
 
Olalla Castro (Granada, 1979) é jornalista de formação com doutoramento em Teoria da Literatura e Literatura Comparada (tese sobre Enrique Vila-Matas, à qual foi atribuído o Premio Extraordinario de Doctorado). Começou a publicar poesia em 2013, com “La vida en los ramajes”. Além de poesia, publicou ensaio, contos e literatura infantil. Organizou várias antologias. Têm-lhe sido atribuídos diversos prémios desde a estreia em 2013. Cantora e letrista em diferentes projectos musicais, destaca-se também em Espanha como uma voz activa na luta pelos direitos das mulheres. Poema incluído no livro "Todas las veces que el mundo se acabó", Pre-Textos, Setembro de 2022. Versão de HMBF.

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