quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

UM PROBLEMA DE WC

 
A polarização é a principal estratégia do populismo de extrema-direita. A tónica do seu discurso está sempre na separação entre bons e maus, entre virtude e vício, como se não fôssemos capazes do melhor e do pior. É a lógica do fascismo, o princípio maniqueísta que gera muros entre pessoas e fomenta ódios. Todo o discurso sobre imigração assenta numa divisão entre nós e eles, nós os portugueses, eles os pretos, os ciganos, os monhés, os refugiados, nós os bons, eles o diabo. Isto é especialmente caricato num país de emigrantes espalhados pelo mundo, emigrantes que foram e vão para África, Brasil, EUA, Canadá, etc, em busca da riqueza que não encontram cá. As Nações Unidas falam em 2.631.559 portugueses emigrados, ou seja, 26% da população residente no país. Mas o nós e eles é mais do que isto, é o nós cristãos e o eles hereges, é o nós família tradicional e o eles depravados, é o nós direita e o eles comunistas. Toda a esquerda é comunista para a extrema-direita populista. Há também um nós e eles escatológico a tomar conta dessa gente para quem menino é azul e menina é cor-de-rosa. Nada de misturas. A extrema-direita populista não quer mulheres e homens a cagar na mesma sanita, nada de casas de banho mistas. Homem que é homem mija de pé, mulher que é mulher urina de cócoras. Esta é uma das grandes preocupações simbólicas da extrema-direita populista, princípio de toda uma mentalidade segregacionista que começa no intestino e termina no esgoto. Para a extrema-direita populista não há zonas cinzentas, é tudo a preto e branco, não há crepúsculo, é tudo noite e dia. Não aceitam, não percebem, não querem perceber que qualquer um de nós, sem excepção, resulta do cruzamento entre pólos que se misturam, somos num mesmo corpo sangue de inúmeras cores, um caleidoscópio genético que, no fundo, até é bem simples: chama-se humanidade.

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