Sobre o balcão, as máquinas de cápsulas foram dispostas
pelo tipo de brindes que forram as paredes: chocolates, isqueiros, canivetes,
porta-chaves, colunas de som sem fio nem pio. À mesa, os velhos batem cartas,
comentam os dias regados a medronho, enquanto pelas bermas da estrada os
trabalhadores rurais caminham lentamente. O sol pesa-lhes sobre os ombros. As
estufas estão agora entregues ao silêncio dos frutos que já nada têm de
silvestres, domesticados pelos chicotes do mercado de exportação. Silvestres
são talvez as maçãs ali depenicadas por bandos de charnecos que saltam de galho
em galho, da figueira para a nespereira, desta para as parras destratadas onde
cachos de uvas crescem a esmo. Silvestre é o ninho de cegonha branca na falésia
da Amália, a echeveria secunda que medra pelos caminhos sem carecer de
cuidados. Rosas de pedra, diz alguém para quem cada pedra respira como um
animal selvagem. Brindes que não saem nas máquinas de cápsulas. Há 20, 30 anos,
a moda era comprar montes no Alentejo, recuperar as casas ao abandono, algumas em
ruínas, e fazer segundas habitações para férias e descanso. As ruínas agora são
de outro tipo, ainda que aqui e acolá espreitem montes apetecíveis a preços
incomportáveis. São ruínas de plástico, estufas desactivadas, esqueletos de
negócios falidos a aguardar novos investidores do fruto vermelho. São ruínas
humanas, batem cartas, comentam os dias, observam os trabalhadores pelas bermas
das estradas.
Samoqueiro, 1 de Agosto de 2024.
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