sábado, 14 de dezembro de 2024

50 X 15

 


“Faith”, The Cure.
 
Quem diria que aos cinquenta iria voltar a ouvir The Cure com o mesmo entusiasmo dos dezassete. Acontece que “Songs of a Lost World” (2024) é muito bom, quase tão bom quanto “Faith” (1981) e “Pornography” (1982), álbuns de que o mais recente se aproxima depois da deriva pop inaugurada com “Kiss Me, Kiss Me, Kiss Me” (1987). A epígrafe de John Keats, poeta romântico inglês, é pertinente introdução a um conjunto de temas que tem como mote o fim, a morte, o desaparecimento. «This is the end», começa por cantar Robert Smith depois de um intróito de três minutos em ambiente etéreo. A raiz gótica pós-punk mantém-se viva, sobretudo no extraordinário “Drone:Nodrone”. Reeves Gabriels, que tocou com David Bowie, oferece precioso contributo nas guitarras. Lê-se por aí que as letras deste álbum foram inspiradas na obra do decadentista Ernest Dowson, prematuramente desaparecido, o que me deixa com vontade de explorar o escritor inglês. Na sua extrema simplicidade, as letras de Smith dão testemunho da mais complexa das experiências humanas, a percepção do fim que se aproxima e do tempo que passou e do passado irremediável: «I waste all my world like this / intending time and memories / and all for fear of what I’ll find / if I just stop / and empty out my mind / of all the ghosts / and all the dreams»… Singrando no caudal neo-romântico e nostálgico das melodias, estas palavras transportam-me para a mais essencial das aprendizagens que podemos fazer enquanto por cá andamos: é que vamos deixar de andar. A partir daqui, desta consciência nítida da finitude, talvez uma certa modéstia possa ajudar-nos a não sofrer tanto com as reservas do futuro.

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