No Eixo do Mal de ontem, Luís Pedro Nunes mostrou-se preocupado
com a facilidade com que se assassina a imagem pública de alguém nas redes
sociais. Referia-se, obviamente, às reacções provocadas pelo discurso de Isabel
Jonet num programa de televisão. Clara Ferreira Alves insurgiu-se contra Luís
Pedro Nunes dizendo que ele estava a fugir ao assunto, as declarações de Jonet,
mas acrescentou que era aquela "a lógica da Internet". Portanto, "a lógica da
Internet" é assassinar a imagem pública das pessoas em tempo record e de uma
forma automática. Ao ouvi-los, lembrei-me de imediato de uma página do Público
de sexta-feira. Dizia a notícia que o Supremo condenou a SIC a indemnizar
Ricardo Rodrigues em 115 mil euros, por ofensa à honra e dignidade após
divulgar notícias que associavam o deputado socialista a um caso de pedofilia
nos Açores. Estas notícias foram emitidas em 2003, na idade pré-histórica das
redes sociais. A condenação da SIC não foi comentada no Eixo do Mal, havia
assuntos mais importantes a tratar. E logo me surgiram na memória dezenas de
capas de O Independente, e os assassinatos políticos de Ferro Rodrigues e Paulo
Pedroso aquando da polémica em torno do caso Casa Pia, e o tonto director do
misterioso Semanário a desmentir capas do jornal no próprio dia em que eram
publicadas. Nada disto se passou na Internet, e exemplos não nos faltam para
sustentar uma dúvida que a preocupação de Luís Pedro Nunes e a antipatia de
Clara Ferreira Alves para com a Internet suscitam: afinal, qual é a lógica da
imprensa para a qual eles trabalham? Se a lógica da Internet é desfazer a
imagem pública de uma pessoa em cinco minutos, qual é a lógica da SIC agora
condenada pelo Supremo? O que preocupa, afinal, estes assalariados dos media,
que se desdobram em comentários ora sérios, ora jocosos, por tudo o que é meio
de comunicação social? Se for a difusão desregrada da opinião pública,
esqueçam. A solução para o vosso problema seria acabar com a opinião pública,
instituir uma espécie de ditadura da opinião onde apenas os protegidos dos
media teriam direito a tempo de antena. Se, por outro lado, a preocupação
tiver na sua origem os comentários violentíssimos e odiosos que o anonimato
proporciona, desenganem-se. Os anónimos que se entretêm a largar bílis pelas
caixas de comentários fazem parte do mundo, deste nosso mundo, não saltarão
subitamente das caixas de comentários para a rua largando bombas em vez de
insultos. Na realidade, facilmente os imagino curvarem-se reverencialmente
perante os objectos da sua bílis caso se proporcionasse um encontro, um
cumprimento, uma oportunidade, porque não é de agora que facilmente o ódio se
transforma em simpatia no mundo real dos hipócritas. O que se passa nas redes
sociais, e na Internet em geral, é que aquela parte do iceberg freudiano que
não se via passou a estar visível e acessível a todos quantos a queiram
observar. Os recalcamentos, as frustrações, os medos, as opressões dos
indivíduos vieram à superfície em massa. Há quem os prefira escondidos lá no
fundo inacessível da psique, há quem não se incomode com o espectáculo da sua
emergência. Eu apenas preferiria que fosse realmente séria a chamada imprensa
séria e menos obtusa a opinião assalariada. Em nome da verdade, claro.
4 comentários:
de acordo. muito bem.
e esse senhor, Luís Pedro Nunes, é director de uma coisa chamada "Inimigo Público", que faz a mesma coisa que ele critica, disfarçada de humor (com muito pouco graça, diga-se, pelo menos para o meu gosto).
Também preferia uma imprensa séria, concordo. Quanto à internet é o que é, por vezes penso que passifica as pessoas, visto que todas podem andar por lá a descarregar à vontade, nas redes sociais como anónimos ou não. E podem fazer o que não fazem no dia a dia. E se não fosse assim, como estariam as ruas agora?
Esse Luís Pedro Nunes é o director do jornal satírico "Inimigo Público".
Lá dizia o frei Tomás...
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