terça-feira, 6 de novembro de 2012

COMO ACORDAR UMA MANADA?


Quando se pede a um interlocutor que seja realista, outra coisa não se lhe pede senão que olhe para a realidade através da perspectiva que lhe é proposta. Dito isto, sejamos realistas. Se nos ficarmos pelo século XX, porque seria doloroso recuar mais, verificamos que o povo português aguentou durante 48 anos uma ditadura de contornos mesquinhos. O salazarismo foi uma coisa católica ensimesmada, de inspiração nacionalista, que lançou o país num atraso de vida cultural, moral, social por demais evidente à época da revolução. Não fosse uma classe militar saturada da carnificina nas colónias, teríamos aguentado mais uns anos o pseudo-salazarismo marcelista. Chamaram-lhe Primavera quando, na realidade, não passou de um triste e enfadonho Outono. A revolução instalou a alegria da mudança, sem transtornos de maior para quem nada tinha a perder (a maioria da população) e uma misericórdia impressionante para com quem tinha andado a roubar. A chegada à CEE, após um período de conturbação política sem nódoas intratáveis, abriu as portas da esperança. O desenvolvimento era o horizonte, o progresso, que veio a verificar-se em variadíssimas frentes, era inevitável. Sucede que durante esses anos posteriores à revolução, logo os vigaristas de outrora regressaram à terra com a teta na mira. A encabeçar uma quadrilha de gatunos na política, todos eles ao serviço de interesses financeiros e empresariais, um obtuso chamado Cavaco. Durante 10 anos, este ser inculto deu guarida a gente do calibre de Isaltino Morais, Dias Loureiro, Duarte Lima, Santana Lopes, Oliveira e Costa ou os agora promovidos Passos Coelho e Relvas. O caso BPN bastaria para meter grande parte desta gente atrás das grades. Mas não satisfeito, o povo meteu o obtuso Cavaco na presidência da República. E com este ser medíocre temos que aguentar mais 20 anos da história portuguesa contemporânea. E vão 68. Agora, o povo português, bastas vezes alertado para o despesismo denunciado nas derrapagens sucessivas em obras públicas de interesse nulo (dos CCBs às EXPOs, dos EUROs 2004 às Pontes Vasco da Gama é só escolher…), queixa-se de lhe andarem a ir ao bolso, como se outra coisa não tivessem feito estes imbecis que nos governam (são exactamente os mesmos) há décadas. Andou o povo entretido com Big Brothers e os jogos da selecção portuguesa de futebol, pendurou as bandeiras nas varandas e tirou fotografias ao pé do Pavilhão de Portugal, para mais tarde recordar, quem sabe, os bons tempos em que podia ser roubado sem perceber que estava a ser roubado. Percebe-o agora. Mais vale tarde que nunca. O que não percebe, e isso torna-se evidente na civilidade das manifestações até agora levadas a cabo, é que isto não vai lá com cantorias nem abraços à polícia nem poses para o retrato no jornal ou hinos da alegria ao som dos Homens da Luta. Patético. Exija-se, de uma vez por todos, que os responsáveis por esta situação sejam julgados. Temos tribunais? Temos juízes? Servem para alguma coisa? E julguem-se esses gatunos, condene-se essa gente, expurgue-se o Estado das sanguessugas que dele se serviram sob pretexto de andarem a servir a nação. Só começando por aí poderemos “refundar” o Estado. Tudo o que não for isso será contribuir para a perpetuação no poder dos novos ditadores, os ditadores da finança, chamem-se eles Ulrich ou António Borges, mais seus lacaios Coelho & Relvas, enquanto a seus pés crescerá uma manada de escravos dispostos a tudo por dá cá aquela palha.

4 comentários:

Anónimo disse...

Eu saberia responder se o título fosse «Como acordar com uma mamada?». Desculpe, Henrique, o mau gosto, mas ocorreu-me isto. E não me contive. Nem é para publicar. É só um cumprimento de um leitor

Anónimo

EJSantos disse...

Como acordar uma manada?
Essa é a questão que levanto à muito tempo.

Unknown disse...

Políticos são como as moscas, chegam sempre primeiro onde sentem o derramado mel.

Pedro Góis Nogueira disse...

O nervo é mesmo esse: "queixa-se de lhe andarem a ir ao bolso, como se outra coisa não tivessem feito estes imbecis que nos governam (são exactamente os mesmos) há décadas.". Completamente de acordo com todo o texto.