quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

ANONYMOUS

O anonimato não espelha necessariamente uma atitude cobarde. Ele pode ser o escudo por detrás do qual o guerreiro se protege num tempo em que uma das maias poderosas armas é o aparecer. Com o tempo vamos aprendendo a valorizar tais armas, sobretudo ao constatarmos que, em certos casos, a supressão do anonimato redundaria apenas no reforço do insuportável teatro das conveniências. Ou seja, desfeito o anonimato: amigos para sempre. 

13 comentários:

manuel a. domingos disse...

Não concordo.

«Ah! Sim, pancada por pancada prefiro as chicotadas impiedosas de um carrasco iracundo, que fere sem contemplações, à flagelação hipócrita do homem que apanha o vigilante de costas para perguntar: «Magoei-te»?» George Darien

hmbf disse...

Então achas que os anonymous são cobardes?

manuel a. domingos disse...

Desconfio da sua boa vontade. Nesta era de informação, contra-informação, desinformação e o diabo-a-quatro... tenho sempre muitas, muitas dúvidas...

Aprecio mais quem dá a cara: Markopolos, Darby, Buxtun, Ellsberg, Felt, entre outros.

hmbf disse...

Mas o que é que te permite chamar-lhes cobardes por desconfiares da sua boa vontade? Repara que a própria democracia assenta no primado do anonimato, ao fazer do voto secreto um elemento fulcral como garante da liberdade de escolha. Nesta era de informação, como dizes, em que tudo é aparecer e pelo aparecer se conquistam as massas ao mesmo tempo que se as manipula e controla, o anonimato pode de facto ser um escudo absolutamente necessário à luta. Repara como o medo que as pessoas têm de perder o trabalho favorece a denúncia anónima de situações de autêntica exploração. Não chamo cobarde àquele que se protege do mal combatendo-o de cara escondida, prefiro chamar cobarde àquele que se acomoda ao mal, que nada faz contra o mal para, enfim, não se chatear. Esse sim, é o verdadeiro cobarde.

manuel a. domingos disse...

Repara que não lhes chamem cobardes. Disse só que desconfio da sua boa vontade. Mas, é certo: também não afirmei que o não eram.

Em relação ao voto secreto e universal: não sei se concordo contigo que a Democracia assenta do primado do anonimato, só porque o voto é secreto. A Democracia assenta no primado da Liberdade, quanto a mim.

Penso que também não poderemos chamar cobarde aquele que se "acomoda". Mas entendo o teu ponto de vista.

Contudo, prefiro a denúncia de cara-aberta. Sei que muitas vezes as denúncias anónimas são a melhor solução para resolver certos problemas; mas também sei que as denúncias anónimas servem, na maior parte dos casos, para dar cabo da vida a alguém. Exemplos não faltam. São mais as vezes em que uma denúncia anónima prejudica, do que as vezes em que ajuda.

hmbf disse...

O post é sobre a injusta imputação de cobardia aos anónimos. Quando dizes "não concordo", presumo que queiras dizer que para ti o anonimato é uma manifestação de cobardia.

Como se garante a liberdade em democracia sem o carácter secreto do voto?

Um outro exemplo curioso é o do professor que pede aos alunos que façam a avaliação do seu desempenho, não sendo necessário assinarem a mesma. Reforça-se a importância de uma avaliação honesta e sincera garantindo o anonimato. Isso em si mesmo não pode ser considerado mau.

Quanto ao resto, não sei de nenhuma contabilidade que tenha sido feita sobre este assunto. Desconheço qualquer estudo que me permita dizer é mais vezes assim do que assado, até porque, sendo as denúncias anónimas, para o bem e para o mal passam-nos ao lado (para isso mesmo o anonimato). Mas uma coisa sei, até pelos exemplos que não faltam: é injusto classificar de cobarde o anonimato por si só. Em si mesmo, ele não é nem deixa de ser cobarde ou corajoso. É um método para se chegar a fins sobre os quais poderás fazer os juízos de valor que te forem mais convenientes. Um vizinho que anonimamente denuncia uma situação de violência doméstica ou um caso de pedofilia na casa ao lado da sua não pode ser considerado de cobarde. O medo que possa sentir de eventuais represálias por causa da denúncia justifica o anonimato.

manuel a. domingos disse...

O anonimato não é para mim uma manifestação de cobardia: apenas aprecio o cara-a-cara.

A garantia de Liberdade em Democracia expressa-se no voto, sendo ele secreto ou não. Expressa-se no voto.

Em relação ao professor: concordo contigo aí. Porque sinto isso na pele. Contudo, também te digo: promovo sempre a avaliação cara-a-cara com base na confiança. Digo mais: já ouvi coisas de alunos, em relação a mim, que nunca esperei ouvir; e nunca os prejudiquei.

Quanto ao resto: de facto também não sei se existe um estudo. Foi uma suposição, um juízo de valor, talvez.

hmbf disse...

Nesse caso, fico com dúvidas sobre o que há no post com o que não concordas.

O voto não secreto existe nas ditaduras, meu caro. O que lhe confere garantia democrática, ou seja, ser a expressão de uma vontade própria e não coacção é precisamente o ser secreto. O meu pai conta-me muitas vezes como votou numas eleições antes do 25 de Abril. E de como, numa terra de fascistas onde foram inventadas mocas para correr com os comunistas, o seu socialismo burguês era de tal modo mal visto que, para não perder clientes e poder manter um negócio, tinha de calar as suas inclinações políticas em pleno regime democrático.

Não está em causa o que eu ou tu apreciamos mais. Está em causa a associação injusta que muitas vezes fazemos entre anonimato e cobardia. Eu digo que os anónimos não são necessariamente cobardes.

manuel a. domingos disse...

Tinha-me lembrado disso, do voto nas ditaduras. Mas como é coação: não considero "voto". Mas sei que posso muito bem estar enganado.

Talvez a minha associação entre anonimato e cobardia advém de ter tido, já, más experiências em relação a denúncias anónimas... e nem vou falar nos comentários anónimos. Com esses lido eu bem.

hmbf disse...

É voto. Só que sendo público, sujeitas-te às consequências. Podes sempre sujeitar-te às consequências.

Lá está, as denúncias anónimas em si mesmas não são más. O que torna má uma denúncia, independentemente de ser anónima ou não, é o que a motiva. Se for o bem, ela tende a ser boa. Se for o mal, ela tende a ser má.

O resto não é assunto, é palermice.

Anónimo disse...

Recentemente li uma matéria que dissertava sobre a impossibilidade de se manter o anonimato nos dias atuais. Ela dizia, entre outras coisas, sobre um aparelho usado pela polícia, durante manifestações públicas, capaz de identificar telemóveis e seus usuários num raio de 200 metros. Não acredito que tal aparelho foi criado apenas para identificar possíveis infrações que qualquer manifestante pudesse vir a cometer, mas sim como instrumento de repressão. Quantos não foram os manifestantes que, sem nada terem feito a não ser se posicionar politicamente, receberam a visita da polícia após os manifestos que o Brasil viveu em junho de 2013?
Recentemente foi aprovado, ainda no Brasil (assim como se tem aprovado novas leis sobre o tema em vários países do mundo) o que os políticos chamaram de “Novo Marco da Internet”. Esse conjunto de novas leis obriga, entre outras coisas, os servidores de sinal a manterem, para possíveis consultas, os dados de navegação de todos os seus assinantes. Não se navega mais em qualquer que seja a página da Web sem que isso seja mantido registrado nos servidores de sinal. E uma simples suspeita já é suficiente para se acionar “legalmente” tais dados. Depois disso, muitos políticos conseguiram identificar donos de sites e perfis nas redes sociais, e, respaldados nas novas leis, os encerraram. Somente por fazerem críticas, ainda que algumas vezes através da ironia, a esses mesmos políticos.
E o que dizer de países cuja manutenção do anonimato pode ser a única proteção com a qual o “rebelde” conta para proteger a sua vida contra o sistema que o persegue? E o que dizer de países onde a democracia (liberdade?) vigora, mas cujos governos podem acessar qualquer dado dos usuários da Web (ou mesmo gravam conversas telefônicas!) sob o pretexto da “guerra contra o terrorismo”? Quanto estamos dispostos a abrir mão de nossa suposta liberdade em prol da segurança?
O anônimo consciente, no entanto, sabe muito bem que o seu anonimato é relativo. Facilmente quebrado. Muitas vezes ele o mantém simplesmente como posição perante o tempo em que se vive, em que a notoriedade parece ter adquirido mais importância do que o conteúdo. Ele assume as coisas que diz, até porque seria difícil manter a autoria para sempre velada, mas se rebela contra a sociedade em que a bajulação e/ou a banalização da execração pública excederam todos os limites do bom senso.
Há outras razões para se manter o anonimato (os debates muitas vezes perdem caracteres importantes quando os interlocutores sabem com quem estão a debater, por exemplo), mas quis eu destacar estas, por me chamarem mais a atenção.

manuel a. domingos disse...

Um gajo está sempre a sujeitar-se às consequências.

Concordo.

Idem.

Anónimo disse...

Não considero que quem opte por ser anónimo seja covarde, pelo contrário, reconheço-lhe alguma coragem. Acho que é preciso distinguir entre traição e anonimato. Traidor é o que dispara nas costas do outro, anónimo é o que duela de cara tapada. Num mundo preenchido de caras e caretas, onde interessa mais a imagem do que a opinião, aplaudo quem faz/escreve apenas porque sim!