Maria Helena é uma espécie de bruxa fina com direito a espaço mediático nas
manhãs da SIC, em canal aberto. Já publicou livros, os quais vendem que nem
tremoços. Maria Helena diz que resolve problemas de Amor, Trabalho, Saúde,
Dinheiro, tudo através do poder dos astros e das cartas. A popularidade destas
técnicas ancestrais é indiscutível. Podemos, no entanto, interrogar-nos por que
está a Maria Helena nas manhãs da SIC e não o Professor Karamba? Talvez a
resposta resida naquilo a que chamamos poder de comunicação. A Maria Helena
é loura, apresenta-se como um anjo caído do céu com o ar respeitável que um par
de óculos confere. Sente-se como peixe na água à frente das câmaras, não vacila mediante questões palermas. Tem
uma capacidade retórica invejável.
Nos tempos que correm, tudo se reduz ao
poder de comunicação. Não importa o que se diz, os conteúdos podem ser os mais
abjectos e imbecis desde que a forma seja a correcta. Na arte também se passa isto. Maria Helena é o paradigma do artista tagarela que expõe um tijolo
no meio de uma sala mas consegue elaborar um discurso coerente e sedutor acerca
do tijolo, conquistando assim atenções e adeptos para a sua causa. Não importa
a obra, importa o discurso que se tenha acerca da obra. Não importa a
razoabilidade do tarot, importa o palavreado, a conversa, a tagarelice em torno
das cartas.
Há quem não veja mal algum no sucesso destas personagens, afirmando com complacência e certo
desleixo: desde que as pessoas se sintam bem. Pois, desde que as pessoas se
sintam bem. Sempre que ouço alguém falar assim recordo-me de um episódio numa
série (House, M.D.?) em que uma rapariga se queixava de que o seu namorado só
queria ver pornografia e não fazia amor com ela. O rapaz sentia-se bem a ver
pornografia, retirava mais prazer da masturbação enquanto assistia a cenas
porno do que a fazer amor com a namorada. Para a namorada ele tinha um
problema, mas ele achava que não. Sentia-se bem. E se calhar não tinha, e se calhar tinha. Mas o problema dele não o afectava, afectava
a sua relação com a namorada.
Ora, com as Maria Helena deste mundo passa-se o mesmo. O prazer não está no bem-estar que proporcionam a quem as tenha
em boa conta, mas na relação que os espectadores passam a ter com a realidade,
com a ciência, com o saber, com o conhecimento, com o mundo à sua volta. Jorge
Jesus é a antítese de tudo isto. As suas capacidades retóricas são
absolutamente miseráveis. Quem o ouça falar só pode concentrar os seus esforços
na contenção do riso. O homem é uma máquina de produzir calinadas. No entanto,
os seus méritos de treinador são inegáveis. Jorge Jesus é a personificação derradeira da cultura de mérito. Como costuma dizer-se, percebe de
futebol como ninguém. Talvez a linguagem dos homens que lidera seja do mesmo
tipo, talvez exista entre ele e os seus jogadores um patamar comunicacional que
escape ao mundo que os rodeia. Portanto, nada mal desde que resulte.
Não
importa que o português de Jorge Jesus seja miserável, não importa que nas
conferências de imprensa ele diga as maiores barbaridades para a plateia de
milhões que aguarda ansiosamente qualquer uma das suas intervenções. Importa
que resulte. A favor do espectáculo. Não fosse este lado pragmático da
showciedade, poderíamos olhar para Jesus como um contrapoder, um digno representante
da contracultura comunicacional. Mas tal como a Maria Helena nos ensina a
sermos felizes, o Jorge Jesus explica-nos os trâmites do desaire. São ambos figuras de um
alçapão mediático que ajuda a entender o sucesso das iniquidades que têm na
sua origem um crescente desrespeito e desinteresse por tudo quanto leve a um
pensamento articulado, aquele onde a linguagem não fica reduzida à superficialidade
de uma qualquer forma de empatia.
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