Que esperar daqui? O que esta gente
não espera porque espera sem esperar?
O que só vida e morte
informes consentidas
em todos se devora e lhes devora as vidas?
O que quais de baratas e a baratas
é o pó de raiva com que se envenenam?
Emigram-se uns para as Europas
e voltam como se eram só mais ricos.
Outros se ficam envergando as opas
de lágrimas de gozo e sarapicos.
Nas serras nuas, nos baldios campos,
nas artes e mesteres que se esvaziam,
resta um relento de lampeiros lampos
espanejando as caudas com que se ataviam.
Que Portugal se espera em Portugal?
Que gente ainda há-de erguer-se desta gente?
Pagam-se impérios como o bem e o mal
— mas com que há-de pagar-se quem se agacha e mente?
Chatins engravatados, peleguentas fúfias
passam de trombas de automóvel caro.
Soldados, prostitutas, tanto rapaz sem braços
ou sem as pernas — e como cães sem faro
os pilhas poetas se versejam trúfias.
Velhos e novos, moribundos mortos
se arrastam todos para o nada nulo.
Uns cantam, outros choram, mas tão tortos
que a mesquinhez tresanda ao mais singelo pulo.
Chicote? Bomba? Creolina? A liberdade?
É tarde, e estão contentes de tristeza,
sentados em seu mijo, alimentados
dos ossos e do sangue de quem não se vende.
(Na tarde que anoitece o entardecer nos prende).
Lisboa, Agosto 1971
Jorge de Sena, de Exorcismos (1972), in Poesia - III, Edições 70, Agosto de 1989, p. 177-178.
6 comentários:
Que sequaz ou régulo
sujeitará o meu desdém?
Eu morrerei deste século
às mãos de quem?
Quem de entre vós,
desagravando o meu peso,
me elevará a algoz
do meu próprio desprezo?
Quem me jogará a sorte?
A que émulo do meu émulo
deverei eu o que me devo?
Ser da minha morte
o inteiro asco do meu século
e do meu século por fim coevo.
É teu?
Se eu puxei a tosse e preenchi os espaços com esse escarro, sim. Mas o catarro é o de mais alguns.
Agrada-me.
É porque és um catarrento.
Medicado, ainda por cima.
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