O PAÍS DA CHUVA E DA DISTÂNCIA
Todo o esplendor termina, as grandes vozes emudecem,
o verde-mar das pradarias seca,
mas aquilo que mais profundo e íntimo foi
perdurará na memória inapelável,
ali de onde o poema impreciso vigia
esperando que regressem os deuses do desterro.
Pois também a memória tem suas avenidas
de luzes silenciosas e esquinas recolhidas,
sua margem passando pelo fio do sonho.
O esquecimento cansa-se de chamar à sua porta.
O saguão é quem vela enquanto a casa dorme.
Houve um na infância, a recordação
colocou certa vez ali sua magnólia figo.
E na cancela eu desenhei uma tarde
o país da chuva e da distância.
Raúl González Tuñón (n. 29 de Março de 1905, Buenos
Aires, Argentina - m. 14 de Agosto de 1974, idem), traduzido por HMBF a partir
da versão coligida por Marta Ferrari, in Poesía Argentina - Antología
esencial, vol. 7 da colecção La Estafeta del Viento, dirigida por Luis
García Montero e Jesús García Sánchez, Visor Libros, 2010, p. 52. Poeta e
jornalista, Raúl González Tuñón participou na vanguarda literária argentina da década de 1920.
Viajou pela Argentina, cobrindo acontecimentos trágicos que o motivaram a
desenvolver uma poesia de cariz social. Os seus poemas são habitados por ladrões,
prostitutas, marginais, pelos excluídos dos bairros, dos mercados e das praças
de Buenos Aires. Contactou em Espanha com poetas tais como Federico García
Lorca e Pablo Neruda, tornando-se fervoroso militante antifascista. Filiado
no Partido Comunista da Argentina, permaneceu fiel às suas convicções estéticas
polemizando com outros membros do partido vinculados ao chamado “realismo socialista”.
É hoje considerado o fundador de uma corrente moderna de poesia urbana, dando
lugar ao testemunho e às temáticas sociais. Estreou-se em 1923 com Las puertas
de fuego.
2 comentários:
É mesmo uma preciosidade - a poesia a atingir-nos fundo.
E ainda há mais. :-)
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