Arriba o Maio. O homem sega a erva da semente, gadanha afiada na véspera. Agora as forquilhas esvoaçam o estrume sobre o campo. Outros homens e mulheres, rito fraterno, ajudam à vessada. Nasce o sol e o incitamento às vacas, farpeadas pelas moscas que o suor seduz. Suave aroma emerge da terra. O homem, mãos nas rabiças do arado, sente o fascínio remoto de dominar a natureza - domínio aqui é acto de ternura. A terra revolvida em silêncio, o círculo de gente em redor do açafate e da cabaça de vinho. Bebem e comem a fadiga. Riem as mulheres, descuidam as pernas. Cantam. A alegria é coisa simples: como a aiveca do arado, o erotismo do vinho. O povo, diz o homem do saco de cabedal, é triste. Mesmo quando canta.
Francisco Duarte Mangas, in O Homem do Saco de Cabedal, Campo das Letras, Maio de 2000, p. 49.
3 comentários:
Uma gralha: "cabaça".
Excelente selecção de um texto de excepcional qualidade.
Parabéns!
Grato pela correcção.
tão bom! até se sente o aroma da terra amanhada e a sua frescura, nas mãos
Enviar um comentário