sábado, 23 de maio de 2020

UM POEMA DE SUSANA ARAÚJO


TERROR

O terror é isto que começa aqui
a multidão junta-se em vão nas
varandas cegas para o que está para vir

O homem deitado sobre a linha do eléctrico
há meses que deixou de tomar a medicação
sorri ausente, de braços estendidos sobre o alcatrão

Não há anestesia que disseque
estes membros sem nação
Europeus que ainda respiram

Tremer é espasmo involuntário
com pouco de imprevisto e
nada de arbitrário. Se Dezembro
dissipar todos traços do seu hálito
com um manto frio
o homem reconhecerá que
deste lado
não sobeja alívio nem na noite
(por isso continuará a sorrir)

As bombas que rebentam mil vezes na
televisão, invejam por cá a destruição
que cai, nevando serena e em silêncio.

Susana Araújo, in Dívida Soberana, Mariposa Azual, Novembro de 2012, p. 24.

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