segunda-feira, 9 de novembro de 2020

ARTUR DO CRUZEIRO SEIXAS (1920-2020)


O Questionário de Proust

O principal atributo do seu carácter?
A ingenuidade, mantida a todo o custo.

Que qualidades mais aprecia no homem?
A inteligência e a sensibilidade, que o conduzirão à Liberdade.

Que qualidades prefere na mulher?
Que seja boa mãe, sendo inteligente, sensível e livre.

Que mais valoriza nos amigos?
Que sejam de facto amigos; entre amigos deve haver lealdade e não hipocrisia.

O seu principal defeito?
Não ser facilmente sociável.

A sua ocupação favorita?
Olhar; é pelos olhos que quasi tudo penetra em mim.

O seu sonho de felicidade?
Acabar com as guerras, como algumas a que tenho assistido, que afinal não justificam os sacrifícios humanos.

Qual seria a sua maior infelicidade?
Que o mundo não saísse rapidamente deste terrível impasse.

Quem gostaria de ter sido?
Não invejo ninguém, e vivo apaixonadamente.

Onde gostaria de viver?
Num sítio isolado junto ao mar.

Que cor prefere?
Todas, puras e impuras.

A sua flor preferida?
As flores do campo.

O seu pássaro preferido?
Todos.

Os seus prosadores favoritos?
No espaço deste questionário prefiro Dostoievski, e o nosso Camilo Castelo Branco.

Os seus poetas favoritos?
No espaço deste questionário apenas refiro Rimbaud, Lautréamont, Cesário Verde, Mário Cesariny, Herberto Helder...

Os seus heróis da ficção?

As suas heroínas da ficção?

Os seus compositores favoritos?
Bach.

Os pintores?
Muito resumidamente, Piero Della Francesca, Grunewald, Bosch, Patinir, Blake, Goya, Cesanne, Kandinsky, Simbolistas, Picasso, Miró, Amadeu de Souza Cardoso, António Quadros, Mário Eloy, etc.

Os heróis da vida real?
Os loucos que não sejam fingidos.

As heroínas da história?

Quais os seus nomes favoritos?
António, João, Victor, Manuel...

A sua aversão de estimação?
A cobardia perante a vida, o calculista, a ânsia do dinheiro.

Acontecimentos históricos que mais o desagradam?
As escravaturas que ainda existem.

O dom da natureza que mais gostaria de ter?
Voar, e ter a força suficiente para levar comigo mais alguém.

Como gostaria de morrer?
Diluído na atmosfera.

Qual o seu actual estado de espírito?
A desejar e temer a morte.

Que falhas lhe inspiram maior tolerância?
A ignorância, que pode ser uma forma de saber.

A sua divisa?
Liberdade para todos.


In Apeadeiro, revista de atitudes literárias, números 4 e 5, Inverno de 2004, direcção de valter hugo mãe e Jorge Reis-Sá, Quasi Edições, Janeiro de 2004, pp. 57-61. No mesmo dossier constam conteúdos diversos, entre os quais uma entrevista por Maria Augusta Silva. A dado momento, isto:

Enquanto artista, sente-se maltratado pelo seu país?
Imenso. Neste país é preciso andar atrás dos ministros e isso não faço; é preciso darmo-nos com gente importante e não me dou nem a procuro, e muito menos políticos. Ao longo da vida conheci pessoas importantes, algumas amáveis, com quem tive ou tenho uma relação civilizada.

Marginalizado?
De certo modo, mas nem será por mal. Um elefante põe a pata em cima de uma formiga e nem sabe que está a pisar a formiga.

É na página 26.


1 comentário:

Maria disse...

E tanto elefante que anda por aí... e a maioria deles quer mesmo pisar as formigas...
E assim vamos ficando culturalmente mais pobres.

Gostei mesmo de ler este postal.
🍂🍁🍂
Maria