terça-feira, 3 de novembro de 2020

POETAS-VELHAS


 

A abjecção promovida por condições sócio-políticas será a única a explicar a vagabundagem do poeta? Sabemos que não. Artaud fugiu espavorido da democracia francesa dos anos trinta, Mayakovsky suicidou-se em plena gesta do comunismo russo. A estes dificilmente se poderá contar o conto do abjeccionismo nos termos em que, sempre ao contrário do surrealismo, faz ditosa carreira em Portugal. Precisamente: entre os «abjeccionistas» portugueses ninguém abandona o local de trabalho, ninguém descura mostrar ao vizinho o abjecto comum, ninguém mata, ninguém se mata, ninguém enlouquece entre os taraumaras. «São poetas-velhas, homens velhos dum mundo que se esfacela e se degrada».


Mário Cesariny, in Jornal do Gato - Contribuição ao saneamento do livro pacheco versus cesariny edição pirata da editorial estampa colecção direcções velhíssimas, Editado por Raul Vitorino Rodrigues, 1974, pp. 20-21.

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