Nasceu em Helpston, este The Northamptonshire Peasant Poet.
Começou a trabalhar na agricultura ainda em criança, depois foi garçon no bar
Blue Bell. Também trabalhou como jardineiro, acampou com ciganos, foi queimador
de cal. De saúde precária, mal alimentado, socorreu-se nas paróquias locais. A
leitura de The Seasons, de James
Thomson, levou-o a escrever os primeiros poemas. Em 1820, sai o seu primeiro
livro: Poems Descriptive of Rural Life
and Scenery. Não podia ter um título mais adequado. É precisamente isso o que
caracteriza grande parte da poesia do primeiro dos três bardos antologiados e
traduzidos por Ricardo Marques em Três
Bucólicos Ingleses (Elysium, Setembro de 2020), uma poesia descritiva da
vida rural, com suas cenas, paisagens, lugares, pessoas, trabalhadores, com sua
fauna e flora, as Lebres a brincar, A raposa, a Névoa nos prados, os Estudantes
no Inverno.
Clare foi muito elogiado pelos seus poemas iniciais. Casou-se nesse
mesmo ano de 1820. Dividido entre os saraus literários londrinos e o analfabetismo
da vizinhança, passou por graves momentos de depressão. Perdeu a aura inicial,
afogou-se em álcool, procurou refúgio num asilo para doentes mentais. Dizia-se
Lord Byron, dedicando-se a reescrever os poemas deste. Também dizia ser Shakespeare,
o génio da Renascença, mas no magnífico poema Eu sou!, incluído na antologia de Marques, é perceptível a
frustração: «Eu sou o que se consome com os seus problemas». Sentia-se desprezado
e abandonado pelos amigos. Fugiu do asilo em 1841, caminhando 130 km na
direcção de casa. Voltou a ser
internado num hospital psiquiátrico: «To the enquiry "Was the insanity
preceded by any severe or long-continued mental emotion or exertion?", Dr
Skrimshire entered: "After years of poetical prosing."» Eu sou!, o poema, foi escrito nesta
altura, em pleno internamento.
Morreu com um acidente vascular cerebral no dia
20 de Maio de 1864. Do bucolismo inicial à soturnidade espiritual no termo da
vida, John Clare revela-se um poeta mais complexo do que possa parecer à
primeira vista. Entre os poemas traduzidos por Ricardo Marques, há vários que
merecem ser lidos com atenção. Deixo um:
Humores de Verão
Eu adoro andar sozinho ao lusco-fusco
pelas ruas estreitas, cheias de espinhos orvalhados
onde debaixo da erva crescida o caracol
azeviche se arrasta e faz sair as tímidas antenas
Gosto de meditar sobre outros prados recém-cortados
onde a erva caída o ar abafado incensa
onde as abelhas buscam com ar triste e cansado
em vão flores recém-nascidas, acabadas de florescer,
enquanto no milho sumarento, a codorniz escondida
grita “eu eu eu” e, se oculta, como pensamentos invisíveis,
A feérica e raramente vista galinha d’água
Repete “crique crique” como vozes subterrâneas
feliz por encontrar o véu orvalhado da noite
e ver a luz desaparecer em trevas ao redor
Nota: a transcrição respeita a versão publicada em livro,
apesar das vírgulas me parecerem escusadas.
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