quarta-feira, 6 de julho de 2022

UM POEMA DE MARÍLIA MIRANDA LOPES

 


ALHEAMENTO ONDULATÓRIO

VII
4'33''

Falhamos.
A luz também, às vezes.
Ainda estamos no século vinte e um
sob uma suspeição de alavanca.

Ouvimos John Cage
ao minuto quatro ponto trinta e três.
Leio, entretanto, uma frase de Breton, de 1948:
"Aqui devia estar a liberdade, dizem-nos, mas ninguém sai".
Não chego a tempo para que a ouças
na estação vazia:

já embarcaste.

A chuva desliza nos meus olhos absortos.

!Ó voo inútil
que não atinges nada!

Mudas-me o peito em gelo:
granítico, alvo, 
tenso.

Marília Miranda Lopes, in Os Electrões Também Devem Ter Alma, com desenhos de Álvaro Siza, Editora Exclamação, Novembro de 2021, p. 51.

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