quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024

CALIGRAFIA INICIAL

 

Começa por surgir à mão, num caderno. Com o tempo, as coisas vão ganhando forma e arruma-se tudo em Word. Distribuis, revês, cortas, recortas, acrescentas, mudas, experimentas. Talvez solicites uma leitura a um amigo ou dois. E mediante o que eles dizem ou calam, voltas a misturar, a refazer, pensas, repensas, baralhas, reordenas. Leva um tempo danado até que dês por concluído o trabalho. Decides então mostrá-lo ao mundo, entregas a um editor ou a uma amigo que o pagine. Chegam as provas. Revês o miolo, aprecias a capa, as pinturas interiores concebidas por uma amiga, a generosidade de quem foi teu cúmplice em mais um gesto. E no miolo corriges o que há a corrigir até chegarem novas provas para novas correcções e mais provas que corrigirás certamente, porque há sempre qualquer coisa que descobres. Depois há o lado burocrático da coisa, o lado burocrático da coisa exige registos, orçamentos. E aí estão as artes finais. Pedem correcções, reenvias com alterações, novas artes finais, renovadas artes finais. Até que a tinta começa a ser disparada contra o papel e tu ficas à espera, aguardas. Até que o produto te chegue às mãos, passaram anos, horas e mais horas de trabalho. O que sobra da caligrafia inicial? É este o maior desespero, garantir que a caligrafia inicial não se perde. Que jamais se perca a caligrafia inicial, ela é o sangue das palavras. Que não se perca. Nunca.

Sem comentários: