quinta-feira, 17 de outubro de 2024

ALGUMAS PREMISSAS

 


A poesia tende à essência humana.

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Nenhuma lógica poderá explicar a originalidade do espaço poético, a sua autonomia e a sua verdade. Só a sensibilidade de cada um de nós, leitores, poderá ser a pedra de toque para aferir a sua autenticidade.

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Numa época de imperialismos ideológicos em que de todos os lados se pretende arregimentar os homens e em que estes, por seu turno, procuram a sua segurança nas diversas formas de paternalismo em que aliviadamente possam abdicar da sua personalidade, a poesia, por muito restrito que se afigure o seu âmbito, constitui actualmente uma verdadeira potência regeneradora.

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A poesia situa-se, pois, ao nível deste humanismo concreto e libertador, antidogmático por excelência.

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O poeta tem o dom de ultrapassar o nível de consciência reflexiva e de instalar, por momentos, na consciência profunda ao nível da espontaneidade criadora, onde as energias naturais se desencadeiam na linguagem antes de qualquer conceptualização. 

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A poesia é criadora de valores - logo profundamente social.

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A poesia surge assim como negação de um mundo para se propor a si mesma na violência da sua liberdade, da sua existência absoluta mas confinada a si mesma. A poesia como liberdade total consciente de si própria, nasce no momento histórico em que não há possibilidade de participação fecunda no corpo social.

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A poesia não se limita a dizer o que diz, seja o que diz uma mulher, a crença numa religião, a fé numa ideia, etc. Essa pretensa univocidade que leva os comentadores a tentar explicar o poeta (seja clássico ou moderno) por aquilo que na poesia é «de», isto é, a sua aparente determinação temática, é o erro de quantos, tratando de poesia, não reparam que ela essencialmente... poesia.

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Ortodoxia e poesia são incompatíveis.

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A poesia não prescinde da linguagem, pois que é fundamentalmente um acto expressivo.

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A partir de Rimbaud a poesia passa a ser «um sopro que abre brechas nos muros». Assim se entra num mundo onde o real foi destruído, onde a única realidade é a própria linguagem.

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O poema só pode ser entendido a partir de si mesmo, porque ele tem em si mesmo origem e o seu fim é ele próprio.

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A poesia só aparentemente é evasão - na realidade, é um alargamento de horizontes, um aprofundamento até às raízes do ser.

António Ramos Rosa, in Poesia, Liberdade Livre, O Tempo e O Modo, Livraria Morais Editora, 1962.

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