os corredores, as naves para lá das vidraças,
os mesmos restaurantes fast food
com ementas iguais em todo o mundo,
e as escadas rolantes a arrastar
não se sabe para onde
a gente derreada
que enche as salas de espera
e sujeita os serviços de higiene
a constantes avisos amarelos
à porta dos lavabos
e a alterações nas pautas de registo.
Quem pense no destino metafísico
da humanidade
escrita com maiúscula de Deus,
future só que bichos somos
quando andamos em sítios tão assépticos,
longamente pensados por
equipas de arquitectos e peritos
de grandes companhias,
e, como isto, imagine
que o volume de urina e fezes
foi cuidadosamente calculado e falhou,
vendo-se cada vez mais avisos de limpeza
na terra de ninguém, cheia de gente
que tem o mesmo ciclo digestivo
e embarca a toda a hora,
enquanto outra vai chegando e não dá vazão
ao sistema de esgotos, planeado
para os aeroportos quando eram soberanos
como a dívida pública
dos países mais pobres que hoje enviam
nuvens de expatriados pelo céu
às pistas de aterragem,
em companhias low cost,
disfarçados de ricos e libertos,
e belas raparigas
com malinhas de rodas atrás delas,
nascidas em subúrbios tristes,
em terras de ninguém como a que pisam.
Nuno Dempster, in Elegias de Cronos, Artefacto, Junho de 2012, pp. 41-42.
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