quarta-feira, 14 de abril de 2021

O QUE É UM POEMA?

 


A poesia pode muitas vezes abraçar a alegria e o desespero que se sente quando se acredita que viver é saber, que saber é dizer, que dizer é fazer-se ouvir e que fazer-se ouvir é impossível.
(…)
Para mim, um poema é a primeira pressão a frio da experiência. Qualquer coisa de essencial é extraído do caos da vida, a partir do desconhecido constrói-se qualquer coisa que se pode conhecer, no coração do tumulto descobre-se um silêncio, da confusão nasce a claridade. E é sempre temporal, uma evocação da nossa condição mortal, um prazer que insiste na sua dificuldade.
(…)
Um poema é uma renegação do privilégio que nega a mortalidade: não é nem eterno nem imediato. É uma outra coisa. Um poema só existe no momento em que é lido ou ouvido. O resto é memória
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Daniel Keene in, Pièces courtes 1, Montreuil-sous-Bois, Éditions Théâtrales, 2005.


O que é um poema? Seria preciso um poema para responder a esta questão, o que pode começar a deixar entrever o que é um poema. Talvez um poema seja uma resposta imaginária a uma questão inexistente. Talvez um poema seja uma condensação de sentido a ponto de chegar a uma realidade única e indesmentível (por mais modesta que seja). Talvez um poema seja música disfarçada de escultura, ela própria escondida num quadro. Talvez um poema seja qualquer coisa que insiste na presença ao ponto de se tornar pura presença. Talvez um poema seja apenas o espaço entre dois silêncios (mas o silêncio depois do poema é diferente do que o precede, o silêncio é alterado pelo poema). A poesia existia antes da escrita. Era uma arte oral/uma tradição oral. Para existir, nem que fosse só para existir, a poesia exigia que o poeta falasse ou cantasse diante de outro. O poema nascia no ouvido do ouvinte. Era teatro.

 

Daniel Keene, in Pièces courtes 2, Montreuil-sous-Bois, Éditions Théâtrales, 2007.

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