segunda-feira, 2 de maio de 2022

DIÁLOGOS QUE JULGÁVAMOS IMPROVÁVEIS

 
— O António está do lado da Luísa.
— Onde é que viste isso?
— Toda a gente vê.
— Eu não vi. Onde viste? Como sabes?
— Então não viste? Mas é óbvio.
— Mostra.
— O quê?
— Mostra em que é que te baseias para dizeres que o António está do lado da Luísa.
— Mas é óbvio, toda a gente vê.
— Já disse que eu não vi, devo estar cego. Por favor, mostra-me, abre-me os olhos, quero ver a luz. Mostra, prova, quero ver em que te baseias para dizeres uma coisa dessas.
— Mas como é possível que não tivesses visto? Não vês?
— Não.
— Mas é óbvio. Se não disse que estava do lado da Ana, então é porque está do lado da Luísa.
— Isso não é assim.
— Nestas questões não há neutralidade, ou estás com a Luísa ou estás com a Ana. Se não estás com a Ana, então é porque estás com a Luísa.
— Eu?
— Qualquer pessoa.
— Eu nem Ana nem Luísa, estou contigo.
— Comigo?
— Sim, contigo.
— Não desconverses.
— Não estou a desconversar.
— Então também estás com a Luísa. Como é possível?
— Mas como é possível o quê, já te disse que não estou nem com a Ana nem com a Luísa. Estou contigo.
— Mas eu estou com a Ana.
— Estás com Ana?
— Estou.
— Então não estás comigo?
— Não.
— Nesse caso, é porque estás com a Luísa.
— Eu?
— Sim, tu, tu é que estás do lado da Luísa.
— Mas porquê?
— Porque nestas questões não há neutralidade. Se não estás do meu lado, é porque estás do lado da Ana e da Luísa.
— Mas eu posso não estar do teu lado estando só do lado da Ana.
— Não podes. Não há neutralidade. Ou estás comigo ou estás com a Ana e com a Luísa.
— Ó pá, não há paciência.
— Podes crer, não há paciência.
— Vou-me embora.
— Então vai, manda cumprimentos à Ana. E à Luísa.  

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