Quero ser outro e é outro que eu me vejo
sentindo que sou eu sem saber quem sou eu
Escrever é sempre outra versão
de um texto que nunca se chegou a compor
Mas é igualmente a diversão
que nos faz vacilar entre o eu e um outro
sem necessitar de ser um ou outro
Há sempre quem procure saber quem é o autor de um texto
como para lhe pedir contas ou referências exactas
mas quem escreve desvia a trajectória paralela
para ser o que já sendo um outro
nunca o é o seu movimento para ele
Ninguém pode decidir Ele é um outro
porque ele é o processo de uma transformação
em que é uma invenção o reconhecimento
e que só é não sendo ou sendo um outro
António Ramos Rosa, do livro Versões/Inversões (1997), in Antologia Poética, prefácio, bibliografia e selecção de Ana Paula Coutinho Mendes, Círculo de Leitores, Fevereiro de 2001, p. 359.
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