Já ninguém semeia, lamenta-se o homem no adro da igreja. A
sombra plantou-o ali e ali ele cresce para a colheita que todos ceifa. As mondadeiras
trabalham agora nos departamentos sombrios das câmaras municipais, o lírio roxo
adolesce distante de olhares contemplativos.
Do outro lado da margem o gado apascenta livremente, deste
lado é um role de dificuldades, decretos, impedimentos. O país teme o estrume
das vacas, ao mesmo tempo que se permite enterrar no estrume da política. Somos de
uma terra emparedada, continua. E eu escuto-o no intervalo que medeia dois
dedos de conversa, um dedo de esperança.
Escuta-se o cante nas ruas desertas, na paisagem estendida
para lá dos sonhos, a paisagem transformada que tudo absorve. Varanda do
Alqueva, diz o poema. Por vezes, convém entrar no jogo da beleza. Sobrevivemos desta
cedência de amarguras que tece lentamente o tapete da paisagem. Tanto céu para
um só milhafre, tanto tempo para uma única história.
E o homem prossegue sua história, esquecido do
vento que fustiga as pedras do cromeleque. Há quantos anos ali fossilizados os
sonhos da humanidade? Assim dispostas, as pedras curvam-nos à terra enquanto
oram pelos astros. Indiferentes a fronteiras e ao desemprego dos homens,
mantêm-se de pé protegidas pelo espanto.
Ora, aqui chegados, que mais podemos desejar do que adiafas
de pão e vinho? Neste pátio, a desoras, os objectos vazios não fazem justiça à
gratidão dos elementos. Alguém teve que semear este bem receber, não vem do
nada o acolhimento. A simpatia rega-se todos os dias, haja quem a semeie. Podem
os garrafões de vidro vazios ser os menires desta nossa pré-história.
Entre Monsaraz e Redondo, Julho de 2014.
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