terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

POLÍTICA DO MEDO, IDEOLOGIA DAS PERCEPÇÕES

 


Disse Pedro Passos Coelho num comício da AD:

Enquanto líder da oposição, em 2016, Passos defendeu "um país aberto à imigração", mas considerou que é preciso ter "cuidado" para ter um "país seguro". "Na altura, o Governo fez ouvidos moucos disso, e na verdade hoje as pessoas sentem uma insegurança que é resultado da falta de investimento e de prioridade que se deu a essas matérias. Não é um acaso", sustentou.

Esta relação entre imigração e insegurança, constante no discurso do Chega, é a parangona mais repetida da direita xenófoba europeia. Lamentavelmente, a AD permite-se adoptar este lamaçal, baseado em mentiras e falsas percepções. Vários estudos demonstram não haver relação nenhuma entre crime e imigração, a não ser o aumento dos crimes sobre imigrantes que a xenofobia e o racismo, o discurso de ódio e o medo induzido pelo populismo de gente como Ventura e Passos Coelho provocam. Tome-se de exemplo este estudo da Universidade de Coimbra, um entre vários que podiam ser citados:

No mundo actual, sempre que há ondas de criminalidade, os imigrantes são os primeiros a ser acusados, independentemente da comprovação da sua culpabilidade. Também em Portugal foi muito publicitado o crime violento, ocorrido nos últimos anos, em correlação com o aumento do número de imigrantes. Além da designação de crimes violentos não ser consensual, existem poucos estudos que se debrucem profundamente sobre este assunto. Os produzidos até hoje chegam mesmo a contrariar esta percepção. Por exemplo, os últimos estudos norteamericanos (Stowell, 2007 e 2009, Sampson, 2006 e 2008) apontam precisamente para uma relação de aumento de imigrantes – descida de registos de crimes violentos, o que é inverso ao publicamente percepcionado. Em Portugal, tem vindo a aumentar a proporção de reclusos estrangeiros e imigrantes nos últimos anos, fenómeno que acompanha o aumento da população imigrante, pelo que não se constata relevância nesta subida. Depois de aplicado o teste estatístico do qui-quadrado, veio a verificar-se que, no geral, os imigrantes têm uma menor intervenção no crime violento em Portugal do que a população autóctone.

Manipuladores como Ventura e Passos Coelho gostam de brincar com o fogo porque sabem que não vão queimar-se, na mesma medida em que legitimam acções violentas sobre os imigrantes. Basta olhar para os portugueses de bem que integram a comitiva do Chega, como por exemplo um tal de Fábio Lemos, preso por violência xenófoba contra um brasileiro em Braga. Diz notícia do Público: «O pernambucano, engenheiro com nacionalidade portuguesa, ficou com uma costela partida e o rosto desfigurado após ter sido pontapeado repetidamente.» Outro exemplo: «Vítor Ramalho, empresário agrícola e ex-candidato do Chega à freguesia de Póvoa de São Miguel (Moura), foi, no ano passado, acusado pelo MP de tentar matar a tiro um casal de imigrantes, tendo-lhe sido apreendidas 13 armas.» Podiam continuar. O discurso de ódio começou por ter como vítimas preferenciais os ciganos, estendendo-se rapidamente aos indianos, aos muçulmanos e aos brasileiros. O ódio aos brasileiros enche neste momento a rede X, com posts consecutivos sem qualquer tipo de filtros.

O ambiente social, o clima que já está instalado em Portugal e tende a piorar, promovido e legitimado pelos discursos de Ventura e, agora, Passos Coelho num comício da AD é uma autêntica bomba relógio que o Estado de Direito e a Democracia não podem deixar deflagrar. Portugal foi sempre um país de emigrantes. Cito:

Portugal tem a taxa de população emigrada mais alta da União Europeia, a população regrediu uma década encontrando-se agora abaixo dos 10,5 milhões, o número de trabalhadores dependentes aumentou, mas a ligação à entidade patronal tornou-se mais precária, Portugal é o quinto Estado-membro onde as contribuições sociais menos pesam no financiamento do sistema de protecção social, a dimensão média das famílias portuguesas desceu de 3,3 para 2,6 pessoas, na última década, Portugal foi o país em que o peso das remunerações líquidas no rendimento disponível das famílias mais caiu, o nível de vida dos portugueses recuou, em 2013, para valores de 1990, ficando 25% abaixo da média europeia, o PIB 'per capita' português caiu 7% face ao padrão europeu e o nível de vida das famílias regrediu mais de 20 anos, Portugal foi o país europeu que registou maior aumento na fiscalidade entre 2010 e 2013, com a carga fiscal a subir mais de 11%, Portugal é também o Estado-membro em que os juros absorvem uma maior proporção da riqueza criada e o décimo que mais gasta em prestações sociais…

É só um resumo, desses tempos em que Pedro Passos Coelho governou. Deixo aos senhores jornalistas umas sugestões de perguntas para fazerem a André Ventura e aos líderes da AD:

Quantos portugueses vivem em Portugiesenviertel, o bairro português de Hamburgo? E em Regents Park, sul de Joanesburgo? E em Ironbound, Newark? E em Macaracuay, Caracas? E em Larochette, no Luxemburgo? E em Täsch, na Suíça?

Tenham vergonha, se não querem ficar com a língua manchada de sangue.

1 comentário:

Transhümantes disse...

O tema da migração é bem mais sério do que aquilo que os meios propaganda fazem dele.
É um assunto que toca a todos. Porque será que quando falamos de migração somos levados a por de parte a técnica ancestral de engenheira social conhecida como plantação? Havia que perguntar quem são os portugueses? Os ciganos, os alentejanos, os descendentes de cabo-verdianos, angolanos ou timorenses que nasceram em portugal? Ou qualquer ser humano com um passaporte que lhe outorga esse estatuto? Quem são os portugueses e em que está baseada a definição de português? Quem a define? ...o aparelho criminoso do estado? Ou o braço legislativo ao serviço do cartel representativo? São os portugueses aqueles que permitem que outros milhares de portugueses sejam empurrados daí porque não há espaço nem alimento para eles? Existem muitas perguntas que deveriam ser debatidas em pessoa e não nessas merdas sociais feitas de écrans e seres fantasmas.
Sempre que sai um ou uma portuguesa porque não se conseguiu alimentar a si e aos filhos existem 10 milhões de responsáveis porque não souberam organizar nem cooperar.


O chega, ou o partido do chega como todos os outros partidos não são mais do que bitolas da ignorância e medidores da alienação dos povos. Servem só para isso, não representam nem estão estruturados para representar mais do que os que à volta deles de alimentam.

Já agora, o palhaço de serviço do chega tem mais aspecto de turco sem carácter do que qualquer português com rasgos africanos. No dia em que desligarem os meios de propaganda, ou seja o circo, acabam-se os palhaços e os donos do circo.

Saúde!