Como num western dos antigos, com slide guitars e harmónicas antigas ressoando numa evocação confessional, um homem misterioso chega num comboio a uma cidade desértica. O seu semblante observador anuncia os preparos de um crime. Patrice Leconte oferece-nos uma pandilha de pensadores. O homem misterioso sabe alguns versos de cor, o seu melhor amigo é pintor, encontram-se em museus e discutem pintura. A traição está prestes a acontecer. Não há pandilhas sem traidores, o cinema há muito no-lo ensina. Mas o homem do comboio deita-se na cama a fumar, olha o tecto e pensa. Foi acolhido, foi colhido pelo acolhimento. Gosta de casas de estilo antigo porque têm história, quer experimentar umas pantufas, senta-se ao piano, descobre numa inesperada cumplicidade a vida que nunca teve, a vida que poderia ter tido. Do outro lado, do lado oposto ao homem do comboio, um velho professor de literatura procura alguma afirmação no termo da vida. Morrerão ambos a olhar um para o outro, à distância, mas como se nunca tivessem sido outra coisa. Morrerão chegando a si próprios, depois de toda uma vida partindo, fugindo, negando-se. Bela forma de morrer. Quem disse que os outros também servem para nos encontrarmos?
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