Vida! quero viver! quero em prazeres
Sequioso saciar-me!
Deste frio letargo, em que hei vivido,
Quero, enfim, libertar-me!
Pr'a longe, o manto da indiferença! Aos gozos!
Eia! aos festins da vida!
Os mais convivas se sentaram há muito.
Dai-me a parte devida.
Pr’a longe pensamentos de tristeza
Gelado desalento!
Vou embriagar-me nas ardentes taças
Beber nelas o alento.
Mundo, dá-me o prazer que aos mais concedes!
Da isolação estou farto.
Adeus, ó solidão, adeus repouso.
Adeus… pr’a sempre eu parto!
Os rumores da turba escuto ao longe
No seio dos folgares;
E só eu, frio, cruzarei os braços,
Não buscarei seus lares?
Oh! não; é tempo, as alegrias chamam-me.
Antes de exausta a taça
Corramos a beber nela, que o gozo
Co’a juventude passa.
Amigos, esperai, eu já vos sigo.
Louco do que se isola!
Nem se torna melhor, nem suas penas
Na solidão consola.
Vamos ao menos no rumor das festas
Sufocar este grito,
Que nos brada: ─ Padece, que de lágrimas
Foi teu destino escrito ─
Vamos… ao menos no fulgor dos bailes
Fascinemos a vista.
Talvez aí se encontre o esquecimento,
Talvez o gozo exista.
Quebremos esta lápide marmórea
Que nos cingia em vida
Ressuscitemos! Eia, ó alma, acorda
Desta feral jazida.
Vamos!... às festas, ao prazer, aos cantos
Às flores e harmonias,
Taças a trasbordar, luzes fulgentes,
Delirantes orgias!
E, então, no meio do delírio fervido.
Perdido, embriagado,
Talvez encontre a paz que embalde tenho
Na solidão buscado.
Abril de 1860.
Esta exaltação, como quase todas, terminou em nada. Não cheguei a incomodar os convivas dos festins da vida para me darem lugar e espero que nunca os incomodarei. Divirtam-se em paz.
Júlio Dinis, in Poesias, Publicações Europa-América, s/d, pp. 247-248. Pobre desgraçado. Nasceu no Porto a 14 de Novembro de 1839. Foi escritor e médico, mas não se livrou da doença. Perdeu a mãe, vítima de tuberculose, aos seis anos. Ele próprio acabou por morrer vítima da mesma doença, com apenas 32 anos. A tuberculose foi a causa da morte de todos os seus oito irmãos. As poesias foram dadas à estampa postumamente, em 1873. Não coube na Antologia.
3 comentários:
Talvez por limitações de espaço! (Digo eu...)
sinceramente não me admira a não inclusão de Júlio Dinis na Antologia. destacou-se, essencialmente, como romancista e não como poeta. assim, também teríamos que incluir Camilo Castelo Branco, que também escreveu poesia e a publicou (não sei se está incluído na Antologia, pois não a tenho aqui à mão-de-semear).
estranho mais a ausênsia de Paulo da Costa Domingos, Jorge Fallorca, Rui Baião e José Alberto Oliveira.
O conde de Monsaraz é mais relevante. Era preciso espaço para o conde de Monsaraz.
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