terça-feira, 7 de agosto de 2012

POSSO AFIRMAR QUE HÁ NOÇÕES QUE NÓS SÓ COMPREENDEMOS TOTALMENTE NUM CAMPO DE CONCENTRAÇÃO


Calçada da Glória, Lisboa. 2012.



Nos contos estúpidos da minha infância, aparecia frequentemente, por exemplo, a personagem do «vagabundo» ou do «rapaz pobre» que entra ao serviço do rei para conquistar a mão da princesa, e com prazer, porque o preço a pagar se resume apenas a sete dias. «Mas, comigo, sete dias são sete anos!» - diz-lhe o rei; pois bem, posso dizer a mesma coisa do campo de concentração. Nunca teria imaginado, por exemplo, que me transformaria tão depressa num velho engelhado. Na nossa terra, é preciso tempo, cinquenta ou sessenta anos, pelo menos; no campo, bastaram três meses para que o corpo me traísse. Posso garantir que não há nada mais penoso, que mais desanime, do que verificar, e assistir, dia após dia, ao que morre em nós.



Fotografia: Jorge Aguiar Oliveira.

Texto: Imre Kertész