terça-feira, 11 de setembro de 2012

O PERIGOSO PROFESSOR GASPAR

O ministro Gaspar dirigiu-se ao país no seu tom impecavelmente pedagógico. A sua pedagogia é anestesiante, funciona sempre de um modo evidente para quem tenha estudado as mais elementares regras dessa velha ciência. É pausado, denota serenidade, faz transparecer uma segurança inabalável. Hão-de reparar que começa invariavelmente por responder aos jornalistas sublinhando a pertinência das questões, agradecendo, até, a inteligência de quem as colocou. E os jornalistas, como quaisquer bons alunos, vão na cantiga, sentem-se valorizados e encantos da vida. Não resistem à táctica hipnótica do ministro, comentando posteriormente no mesmo tom complacente, pacífico e tranquilo os assuntos que a besta contornou com a habilidade dos mestres. A indignação e a revolta pacientam-se com lenitivos baratos. O que a pedagogia do ministro não explica, nem a dele nem a de ninguém no governo, é o que as mais óbvias dúvidas levantam:
- Quem são os responsáveis por termos chegado a este estado?
- Porque não são julgados esses responsáveis?
- Que razões justificam que sejam chamados a pagar as dívidas do país aqueles que nada fizeram para que essas dívidas existissem e se acumulassem?
- Com que critérios se fundamentam medidas de austeridade sobre austeridade que têm por alvo as franjas mais frágeis da sociedade?
- Como se pode compreender esta intenção recente de cobrar mais aos trabalhadores e menos às empresas?

O ministro apoia-se em estudos desconhecidos, receitas não reveladas, experiências empíricas que ainda ninguém comunicou. Os jornalistas ouvem atentamente e não indagam. Já não esperamos sequer que algum deles se digne a atirar-lhe um sapato às trombas, mas pelo menos podiam indagar o perigoso professor Gaspar. Estas são cinco dúvidas simples que eu gostava de ver respondidas. O leitor que acrescente as suas.

3 comentários:

alexandra g. disse...

Henrique,
o Vítor Malheiros (vide, se lhe apetecer)do Público de hoje ironiza em torno desta questão, em delicioso jeito de citação. A questão é antiga (muito antiga) e por isso poucos a lerão da forma devida. Não é, decerto, o seu caso. O objectivo é mesmo exterminar. E nós, demasiados a sentir-nos carne para canhão, temos todos o dever de entender.

Uma coisa eu posso garantir, que é a de não baixar os braços. E que, quanto mais me apeteça desaparecer, mais vou lutar para que outros desapareçam.

Anónimo disse...

Também eu gostava!Mas já não tenho esperança que alguém responda...Estou mesmo farta deste estado (será com maiúsculas?)
MF

hmbf disse...

Julgo mesmo que começamos a sofrer no corpo metamorfoses evidentes. Eu tenho cada vez mais os olhos em bico.