Visto Django Unchained (2012), seria crime de lesa série
não regressar ao western-spaghetti tal como ele existiu na sua origem. A famigerada
trilogia dos dólares, de Sergio Leone (1929-1989), é provavelmente a melhor
porta de entrada para o género. Composta por três filmes – Per un pugno di
dollari (1964), Per qualche dollaro in più (1965) e Il buono, il brutto, il cativo
(1966) –, apresenta Clint Eastwood como estrela principal de um elenco
amealhado em várias nações. À época, Eastwood já tinha trabalhado para séries
televisivas de western, mas era ainda um ilustre desconhecido no mundo do
cinema. Podemos dizer, sem fugirmos muito à verdade, que foi Leone quem o
catapultou para um estrelato onde o estilo não é desprovido de substância. Não
admira, por isso, que os primeiros westerns realizados pelo “homem sem nome”
estejam intimamente ligados à trilogia dos dólares.
The Outlaw Josey Wales (1976), por exemplo, parece pretender
contar-nos a história de Joe, o pistoleiro de Per un pugno di dollari (A
Fistful of Dollars), antes de ele ter chegado à mais moribunda das cidades na
fronteira entre o México e os Estados Unidos da América. Tudo aponta para que
esse misterioso forasteiro, adornado com um poncho e de olhar penetrante, seja
um foragido da Confederação. Há no filme de Leone uma linha que nos desperta
esta interdependência, nomeadamente quando, ao salvar a família de Marisol, Joe
responde-lhe que faz o que faz por ter conhecido uma família igualmente martirizada
e não ter havido ninguém, então, que intercedesse por essa família. Ora, Eastwood
terá agarrado nesta linha para construir o seu Josey Wales, da mesma forma que
Sergio Leone ter-se-á baseado em Yojimbo (1961), de Akira Kurosawa (1910-1998),
para a elaboração de Por um punhado de dólares.
Neste caso, o homem sem nome que aporta na fronteira
mexicana situa-se entre duas famílias rivais que disputam o domínio de uma
cidade onde já não há mulheres, apenas viúvas. No auge da Guerra Fria, o
argumento remete para esse tema central. De resto, podemos
estabelecer inúmeras analogias entre este filme e os filmes da saga James Bond.
Com uma diferença substancial: 007 estava ao serviço de Sua Majestade, os
homens sem nome de Leone não estão senão ao serviço de si próprios. Talvez não
seja exclusivamente assim, pois no coração destes pistoleiros acabamos
por encontrar amiúde traumas que os desviam de intentos meramente egoístas. Se o
interesse inicial de Joe é ganhar dinheiro, porque naquele tempo, naquela
cidade, ou se morria ou se enriquecia, ele acaba por libertar uma cidade de um
conflito que a aniquilava e reunir uma família separada pela opressão.
Se numa ponta da cidade os Baxter fazem frente aos Rojo,
situados no outro extremo de San Miguel, é entre ambas as facções, divididas
pela ambição de dominarem o contrabando local, que encontraremos, digamos
assim, a virtude. E a virtude não tem nome, actua sagazmente em função de si
própria, recorre a esquemas, é inteligente e astuta, mas traz na mira o bem,
mesmo que esse bem se reflicta, de um modo mais evidente, apenas na exterminação
do mal. Há um ambiente de espionagem que paira sobre o filme, excelentemente
ilustrado pela magnífica banda sonora de Ennio Morricone e magnificamente
enquadrado na paisagem andaluza. Este ambiente, ao fim e ao cabo, é o das
conspirações que pulverizam a história política universal, levando-nos a crer,
por isso, que também neste sentido o western recupera com tom aventuroso os
grandes temas da humanidade, sejam eles de ordem ética, política ou estética. Dentro
em breve, Per qualche dollaro in più.
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