sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

PER UN PUGNO DI DOLLARI (1964)



Visto Django Unchained (2012), seria crime de lesa série não regressar ao western-spaghetti tal como ele existiu na sua origem. A famigerada trilogia dos dólares, de Sergio Leone (1929-1989), é provavelmente a melhor porta de entrada para o género. Composta por três filmes – Per un pugno di dollari (1964), Per qualche dollaro in più (1965) e Il buono, il brutto, il cativo (1966) –, apresenta Clint Eastwood como estrela principal de um elenco amealhado em várias nações. À época, Eastwood já tinha trabalhado para séries televisivas de western, mas era ainda um ilustre desconhecido no mundo do cinema. Podemos dizer, sem fugirmos muito à verdade, que foi Leone quem o catapultou para um estrelato onde o estilo não é desprovido de substância. Não admira, por isso, que os primeiros westerns realizados pelo “homem sem nome” estejam intimamente ligados à trilogia dos dólares. 
The Outlaw Josey Wales (1976), por exemplo, parece pretender contar-nos a história de Joe, o pistoleiro de Per un pugno di dollari (A Fistful of Dollars), antes de ele ter chegado à mais moribunda das cidades na fronteira entre o México e os Estados Unidos da América. Tudo aponta para que esse misterioso forasteiro, adornado com um poncho e de olhar penetrante, seja um foragido da Confederação. Há no filme de Leone uma linha que nos desperta esta interdependência, nomeadamente quando, ao salvar a família de Marisol, Joe responde-lhe que faz o que faz por ter conhecido uma família igualmente martirizada e não ter havido ninguém, então, que intercedesse por essa família. Ora, Eastwood terá agarrado nesta linha para construir o seu Josey Wales, da mesma forma que Sergio Leone ter-se-á baseado em Yojimbo (1961), de Akira Kurosawa (1910-1998), para a elaboração de Por um punhado de dólares. 
Neste caso, o homem sem nome que aporta na fronteira mexicana situa-se entre duas famílias rivais que disputam o domínio de uma cidade onde já não há mulheres, apenas viúvas. No auge da Guerra Fria, o argumento remete para esse tema central. De resto, podemos estabelecer inúmeras analogias entre este filme e os filmes da saga James Bond. Com uma diferença substancial: 007 estava ao serviço de Sua Majestade, os homens sem nome de Leone não estão senão ao serviço de si próprios. Talvez não seja exclusivamente assim, pois no coração destes pistoleiros acabamos por encontrar  amiúde traumas que os desviam de intentos meramente egoístas. Se o interesse inicial de Joe é ganhar dinheiro, porque naquele tempo, naquela cidade, ou se morria ou se enriquecia, ele acaba por libertar uma cidade de um conflito que a aniquilava e reunir uma família separada pela opressão.
Se numa ponta da cidade os Baxter fazem frente aos Rojo, situados no outro extremo de San Miguel, é entre ambas as facções, divididas pela ambição de dominarem o contrabando local, que encontraremos, digamos assim, a virtude. E a virtude não tem nome, actua sagazmente em função de si própria, recorre a esquemas, é inteligente e astuta, mas traz na mira o bem, mesmo que esse bem se reflicta, de um modo mais evidente, apenas na exterminação do mal. Há um ambiente de espionagem que paira sobre o filme, excelentemente ilustrado pela magnífica banda sonora de Ennio Morricone e magnificamente enquadrado na paisagem andaluza. Este ambiente, ao fim e ao cabo, é o das conspirações que pulverizam a história política universal, levando-nos a crer, por isso, que também neste sentido o western recupera com tom aventuroso os grandes temas da humanidade, sejam eles de ordem ética, política ou estética. Dentro em breve, Per qualche dollaro in più.

Sem comentários: