sábado, 4 de janeiro de 2014

THE LAW AND JAKE WADE (1958)



Ainda não fez um ano, iniciei uma série a que chamei algo pretensiosamente 50 westerns que deve ver antes de morrer. Empreitada impossível de respeitar. Desde logo, porque fiz batota com um filme de Jean Renoir dificilmente encaixável no género. Depois, porque me apetece fazer batota com outros filmes. Mas sobretudo porque 50 não chega, é número parco para tão vasto território. Se ninguém notou, sublinho eu o esforço colocado na diversidade. Esforço inglório, reconheço. Só de John Sturges (1910-1992) já constam na lista cinco filmes: Escape from Fort Bravo (1953), Backlash (1956), Gunfight at the O.K. Corral (1957), Last Train from Gun Hill (1959) e The Magnificent Seven (1960). São todos imperdíveis. Ainda assim, falta aquele que é provavelmente o melhor filme de Sturges: Bad Day at Black Rock/A Conspiração do Silêncio (1955). Geralmente apontado como thriller, não deixa de ser, na essência, um western. E falta o talvez mais convencional The Law and Jake Wade/Duelo na Cidade Fantasma (1958). Deste modo, Sturges fica a pesar mais de 10% na improvisada lista. Constatação algo inusitada para realizador que nunca mereceu tantos créditos quanto outros gurus do género, de John Ford (1894-1973) a Anthony Mann (1906-1967), deste a Sam Peckinpah (1926-1984), sem esquecer Sergio Leone (1929-1989) e outros génios da cowboyada. The Law and Jake Wade tem argumento baseado num romance de Marvin H. Albert, cuja experiência no domínio dos westerns deu azo a uma mão cheia de filmes. Curiosamente, o título português acaba por parecer mais apropriado do que o paradoxo implícito no título original. Jake Wade é um fora da lei retirado, convertido em Marshall numa pequena cidade onde procura refazer a vida. Está de casamento marcado. A personagem, interpretada por Robert Taylor, reproduz estereótipos sobejamente conhecidos do velho oeste. Ao longo do filme apercebemo-nos do percurso de Jake Wade, de como combateu durante a guerra ao lado de uma causa, de como ficou deserdado de causas e se transformou num assaltante de bancos, de como abandonou o submundo da criminalidade e procurou refazer a vida segundo as convenções sociais da época. Não só a história do velho oeste se polvilha destas personagens, homens fruto das circunstâncias ao mesmo tempo marcados por uma consciência natural do mal e pelo oportunismo discutível das suas acções. O que torna Jake Wade especial, digno de originar um filme, é a sua relação com Clint Hollister - Richard Widmark, que observámos em registos completamente diferentes nos filmes Backlash (1956) e Cheyenne Autumn (1964). A personagem de Clint Hollister é implacável, rancorosa, temível. Jake e Clint estiveram juntos na guerra, foram parceiros no mesmo gang, mas enquanto o primeiro foi assaltado pelo remorso o segundo parece ter expurgado de si quaisquer resquícios de culpa ou arrependimento. O filme começa com Clint preso e Jake a resgatá-lo da forca, numa sequência inicial memorável onde o reencontro entre dois antigos parceiros surge despojado de qualquer sentimentalismo. É tudo de uma frieza brutal, como fria e distante será doravante a relação entre os dois. Perguntamo-nos: porque se deu Jake ao trabalho de salvar Clint da forca? Porque em Jake a honra pesa, ser-lhe-ia impossível continuar com a morte de um antigo companheiro a pesar-lhe na consciência. O filme dá então uma reviravolta. Clint junta a antiga quadrilha, acrescenta-lhe um jovem com traços psicóticos, e rapta Jake mais a sua amável noiva (Patricia Owens). Objectivo: desenterrar 20000 dólares que só Jake Wade sabe onde estão, fruto do último golpe perpetrado pela parelha Jake & Clint. A busca do tesouro levar-nos-á a uma cidade fantasma rodeada de índios. São cenas encenadas com uma eloquência visual deslumbrante. As silhuetas dos índios ao longe, a forma como se aproximam do cenário principal, o combate, escondem por detrás da acção uma luta peculiar entre dois homens: Jake e Clint. Tudo aponta na direcção destes dois, nada os reaproxima, um deles terá que ceder e no final ficarão frente a frente como uma inevitabilidade do destino. Não interessa quem vence, porque neste tipo de duelos nunca existem vencedores. Interessa apenas sublevar o campo de batalha de dois homens outrora unidos por uma causa, entretanto afastados pelo carácter. Abel e Caim no palco sempre virgem da humanidade, como o foram, noutro contexto, Pat Garrett e Billy the Kid ou Fletcher e Josey Wales. 

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