sexta-feira, 18 de abril de 2014

VERA CRUZ (1954)



O fim da Guerra Civil Americana em 1865 reservou destinos diversos para os ex-combatentes dos Estados Federados. Muitos, rumaram na direcção do México em busca de uma nova oportunidade. As forças de Benito Juárez batiam-se, então, contra as tropas do Imperador Maximiliano. Trava-se a luta pela independência do México. Maximiliano, nascido em Viena, tinha sido colocado no território pelo imperador francês Napoleão III. Protegido por tropas francesas, ordenou a execução dos líderes republicanos mexicanos. Restava Juárez e os seus homens, essencialmente camponeses, fiéis à causa da independência, desprovidos de armas e de preparação militar. Os mercenários sulistas norte-americanos ofereciam a sua experiência a quem pagasse mais, colocando-se a si próprios numa situação de mercadoria. A história de Borden Chase (mais uma) que Robert Aldrich (1918-1983) adaptou ao cinema em 1954, apoia-se nestes elementos históricos para desenvolver uma aventura frenética, integralmente filmada no México, que resistiu como o melhor dos filmes assinados pelo realizador de What Ever Happened to Baby Jane?.  Vera Cruz apresenta-nos dois mercenários distintos, numa época, nunca é escusado lembrá-lo, em que os EUA disseminaram pelos quatro cantos do mundo este género de profissionais da guerra. Benjamin Trane (Gary Cooper, um ano depois de ter ganho um Oscar pelo desempenho em High Noon) combateu pelo Sul na Guerra de Secessão. Perdeu tudo. A determinada altura, confessa que desses tempos resta-lhe apenas a camisa cinzenta. Mas cedo perceberemos que não é bem assim. Se já não guarda quaisquer resquícios idealistas, colocando o seu interesse sobretudo nos benefícios materiais, a verdade é que mantém uma sageza na arte de negociar que faz dele, apesar de tudo, uma personalidade muito mais diplomática do que Joe Erin. Este, interpretado por um Burt Lancaster desumano, é o típico outlaw sem problemas de consciência. Não tem amigos, desconfia das pessoas, chama a Trane coração mole quando este mata um cavalo para o impedir de sofrer ou defende uma pobre camponesa “juarista” de ser humilhada pelos gangues de americanos que entravam no México nesses tempos. Parceiros na aventura de Vera Cruz, acabarão por confrontar-se num duelo final que parecia inevitável desde o início. Contratados pelo Imperador Maximiliano para escoltarem a condessa Marie Duvarre (Denise Darcel, a mesma de Westward the Women) até ao porto de Vera Cruz, Trane e Joe, mais uma dúzia de homens, juntam-se aos militares comandados pelo marquês Henri de Labordere para uma viagem repleta de surpresas. Entre os americanos requisitados, encontramos o grande Ernest Borgnine (The Wild Bunch) e um incipiente Charles Bronson. Rapidamente a tarefa se complica quando Joe & Trane se apercebem de que estão a escoltar não apenas uma condessa mas também uma quantia inestimável de ouro escondida debaixo dos pés da aristocrata. Ouro roubado aos mexicanos, a caminho da Europa como pagamento pelo reforço das tropas que garantiriam a continuidade do Império. Assistiremos, então, a um curiosíssimo choque de culturas. Por um lado, a aristocracia europeia, colonialista e imperialista, com as suas formalidades e os seus esquemas maquiavélicos de intriga palaciana. Por outro lado, a informalidade dos mercenários norte-americanos, divididos entre um egoísmo selvagem e pretensões meramente pragmáticas e utilitaristas. Por fim, um povo ostracizado e humilhado, em busca da libertação, na defesa de uma causa moralmente nobre com métodos pouco convencionais, representado, sobretudo, pela figura de Nina (a bela Sara Montiel). O que liga esta panóplia é uma teia de interesses diversos, afunilados na direcção de um bem comum: o ouro. Montado com o ritmo dos filmes de aventuras e o realismo dos melhores épicos produzidos por Hollywood, esta obra de Robert Aldrich tem o mérito de transmitir um desencanto sobre as lutas da humanidade que está longe de ser pacífico. As personagens aqui evocadas, exceptuando, talvez, os libertadores de Benito Juárez, retratados com dignidade moral na personagem do General Ramírez (Morris Ankrum), parecem ter-se afastado definitivamente do sentido altruísta que sustém as grandes causas. Com mudanças rápidas de planos, Aldrich sublinha uma agitação que os rostos das personagens não disfarçam. São seres desconfiados e oportunistas num poker onde o bluff e a traição ditam as regras com irreversível fatalismo. Estamos, ainda, no domínio do western clássico, num ano rico para o género com filmes tais como Johnny Guitar, The Far Country ou Drums Across the River.

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