Sábado passado, enquanto conduzia com o auto-rádio
sintonizado numa estação pública, comentei com a minha mulher o espantoso momento
noticioso que acabáramos de ouvir. Acções de campanha da coligação
PPD-PSD-CDS-PP, do PS e do BE. Então e a CDU, não mexe? Estranhámos, até pela
reincidência, não ouvir uma única notícia, um apontamento, uma gravação, o que
fosse sobre a campanha da CDU. Finalmente, aí estão as notícias. O Expresso
informa os portugueses de agressões ocorridas na Festa do Avante. A novidade é
que um grupo de seguranças agrediu e sequestrou seis indivíduos, entre os quais
um longo militante do partido. O partido afirma que encaminhou a situação para
as autoridades. Para apimentar a situação, um dos agredidos queixa-se de
homofobia. Trata-se de um cidadão espanhol que, segundo o próprio, estava a beijar outro homem
quando foi abordado pelos seguranças. Outros órgãos de informação credíveis,
tais como o Correio da Manhã, o Observador e o Sol, agitaram-se com tamanha
novidade e fizeram alarde da notícia. O país está ao rubro, há agressões no
Avante, os comunistas finalmente se revelam. Ainda por cima revelam-se
homofóbicos. É esta a conclusão a retirar, num exercício de causa-efeito-causa que
faria corar de vergonha qualquer racionalista crítico. O PCP pode agora emitir
500 comunicados sobre as ocorrências, a leitura será sempre a mesma e está
explanada no efeito ridicularizador do silogismo: um rapaz queixa-se de ter
sido agredido por seguranças da festa do Avante enquanto beijava outro homem;
os seguranças da festa do Avante estavam a trabalhar para o PCP; logo, os
comunistas são homofóbicos. Para agravar a situação, num dos comunicados do
partido afirma-se que «A verdadeira razão do incidente que conduziu à saída das
pessoas do recinto da Festa teve origem num acto de sexo oral em pleno espaço».
A vítima nega a acusação e questiona: «Se tivesse sido sexo oral justificaria a
violência?» É óbvio que não, a violência nunca se justifica quando está em
causa o amor. O que a gente não sabe, nem há-de querer saber quando a verdade
for apurada pelas autoridades competentes, é o que realmente se passou. Podemos
adivinhar, sobretudo quando estão metidos ao barulho seguranças. Mas adivinhar
não chega. É preciso fazer disto um tema nacional, é absolutamente fundamental
para o futuro do país que o Observador, o Correio da Manhã, o Sol e o jornal do
irmão de António Costa tenham finalmente notícias para dar sobre a campanha, o
programa, a luta da CDU. E que notícia melhor senão um incidente envolvendo
seguranças e seis pessoas numa festa por onde passam milhares, há anos, de
todas as cores e feitios, sem que nada de “especial” houvesse para noticiar. Portanto, lamentar o sucedido, responsabilizar os seguranças e pedir desculpa às vítimas já não chega. É preciso um acto de contrição. Talvez obrigar os referidos seguranças a praticar sexo oral uns com os outros resolvesse o terrível problema. Talvez não. Perguntem ao director do Sol, esse especialista em homossexualidade e casas de banho públicas.
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