A questão deve ser colocada nos seguintes termos: um amador
de livros jamais poderá ignorar o trabalho realizado por um projecto editorial como o & etc. Pequeno, mas influente. Em diversas perspectivas. Influente
porque deu a conhecer o desconhecido, ora traduzindo textos e autores ignorados
pelos educadores das massas, ora projectando novos autores do seu próprio país.
A determinada altura, para as hostes algo neuróticas da poesia portuguesa,
publicar no & etc foi um atestado de competência. Muitos o desejaram,
alguns o conseguiram, outros fizeram-se à vida por caminhos e atalhos
alternativos à alternativa. Confesso que um dia me passou pela cabeça fazer
chegar às mãos do editor aquele original, o livro que podia levar o selo. Confesso
que me passou pela cabeça, felizmente como um relâmpago passa pela paisagem. O
não seria demasiado doloroso, catastrófico, pelo que me precavi de tais
horrores metendo a intenção na gaveta. Isto vinha de um culto que começou a ser
alimentado com um livro adquirido na extinta Assírio & Alvim da Rua Miguel
Contreiras (Cinemas King). Foi-se o cinema, foi-se a livraria, ficaram os
livros. Em Plena Noite ou o Bluff Surrealista, de Antonin Artaud, mais uma vez
traduzido e prologado por Paulo da Costa Domingos. Capa e cortinas de Carlos
Ferreiro. A data de edição é de Novembro de 1988, mas devo tê-lo adquirido quando
comecei a frequentar as salas dos cinemas entretanto desaparecidos. Lá pelos 90
e tais. Em Plena Noite ou o Bluff Surrealista, 2 Cartas Sobre o Ópio, O Suicídio
e Eu Tratei Antonin Artaud pelo Dr. Gaston Ferdière introduziram-me no universo
& etc e marcaram-me para a vida. Poderia eu ter escrito Suicidas sem antes
ter lido as palavras de Artaud?: «A matar-me não será no intuito de
destruir-me, mas sim para me reconstituir, o suicídio será para mim unicamente
um meio de me reconquistar pela violência, de fazer uma irrupção à bruta no meu
ser, de ganhar a pouco segura vantagem de Deus» (p. 37). Talvez, mas seria tudo
diferente. Depois deste, seguiram-se outros. Muitos. E foi sempre um prazer
escrever sobre eles, neste ou noutros espaços de partilha. Deixo links para
alguns desses textos, focados em livros tais como Imitação de Ovídio, de Alberto Pimenta, Negrume,O Ano da Morte de José Saramago e Açougue, de Amadeu Baptista, A Neo-Penélope, de Ana Hatherly, Marias Pardas, de António Ferra, Learicks, de Edward Lear, Vida Extenuada, de Fátima Maldonado, Fialho Negro, de Fialho d'Almeida, Boca do Inferno, de Gregório de Matos, Logros Consentidos e A Disfunção Lírica, de Inês Lourenço, Blues Para Uma Puta Velha, de Jorge Fallorca, Sr. Porco, de Jorge Roque e Guilherme Faria, Obsessão, de José António Almeida, Diário Íntimo, de Luís Amaro, Alçapão, de Manuel Cintra, Curso Intensivo de Jardinagem e Sorte de Principiante e, de Margarida Ferra, À Barbárie seguem-se os Estendais, de Miguel Cardoso, Cancioneiro da Trafaria e Cova Funda, de Nunes da Rocha, Londres e K3, de Nuno Dempster, A Escrita e Averbamento, de Paulo da Costa Domingos, Linhas de Hartmann, de Paulo Tavares, A Máscara da Anarquia, de Percy B. Shelley, Vigaristas, Ladrões e Assassinos, de Raymond Hesse, Zaroff, de Richard Connell, Manifesto da Mulher Futurista, de Valentine de Saint-Point, Bagagem de Mão, de Vítor Nogueira, A Beleza da Vida, de William Morris, 20 Poemas a Anton Webern, de Zé Luís Costa. Outros se seguirão.
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