sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

RELATIVA LOUCURA

   — Olha, Ângelo, ainda ontem na paragem do autocarro, na avenida que tem o nome de Miguel Bombarda, sem atinar as razões de tão súbito destempero, um jovem de cabelo rapado, todo vestido de negro, desatou aos insultos de «cabrão», «cornudo», «filho da puta», só porque alguém lhe passou à frente. Talvez não gostasse de estar em bichas, no mesmo aperto em que te puseram no átrio do Teatro Dona Amélia.
   Se acaso não fossem agora tão brandos os nossos costumes e outro qualquer Bombarda espiolhasse o passado do jovem de quem te falo, certo e sabido que o internariam no Júlio de Matos e ali o tratariam como alienado, mesmo que raivosamente gritasse, como tu fizeste:
   — Eu não estou doudo!
   E, sabes, nada lhe aconteceu.


Serafim Ferreira, in Sombras e Lugares, Editorial Escritor, Outubro de 1993, p. 88.

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