Um rapaz que se diz humorista tentou fazer uma piada com
o atentado de Orlando. Saiu-lhe torta, não tem graça, isto é, não faz rir. Perante
isto, alguém subjectiviza a graça da piada e diz: a mim faz, eu rio-me com esta
piada. Admitimos então que a piada tenha graça para algumas pessoas, o que não
nos passaria pela cabeça passa a ser uma probabilidade comprovada pelas
centenas de likes. Há centenas de pessoas que se divertem com piadas sem graça,
há pessoas para tudo. Num mundo livre o rapaz tem todo o direito a fazer as
piadas que bem entender, assim como eu tenho todo o direito a criticar essas
piadas, a dizer que elas não têm piada, a tentar explicar que elas não são
sequer um produto do humor negro, conceito por detrás do qual se escudam para
poderem existir um pouco acima do que realmente são, isto é, bosta mental. O humor
negro é inteligente, tem raízes literárias demasiado fortes que não podem ser
postas em causa por um ignorante que dá voz ao pensamento dos burgessos. Seria o
mesmo que aceitar para a música de Quim Barreiros o epíteto de barroca. A
ninguém passa pela cabeça, julgo eu, que a música de Quim Barreiros seja erudita
ao ponto de lhe darmos o mesmo valor que damos a Bach. Quero dizer, acho que
tal ideia não passa pela cabeça de ninguém. Mas como disse, há pessoas para
tudo. O que ressalta desta questão, independentemente dos truques que cada um utiliza
para atrair sobre si atenções, é a tremenda confusão que nos armadilha o
pensamento sempre que nos metemos a relativizar e subjectivar tudo como se as
coisas não tivessem o seu valor e esse valor não adviesse de um maior ou menor
conhecimento que temos das coisas e do mundo. Quem determina o valor de uma
coisa? Sejamos mais objectivos, quem determina o valor de uma piada? Será o
riso que a piada provoca? Nesse caso, se a piada provocar mais asco do que riso deveremos considerá-la uma má piada? Julgo que seria demasiado académico
perder-se tempo com tamanha discussão, das discussões académicas retiramos
quase sempre pouco mais do que o ensinamento de um tédio enorme. Tipos que
pensam como burgessos fazem piadas ao nível dos burgessos, são apenas isso
mesmo, burgessos. Assim como os hooligans não são exactamente adeptos de
futebol, também o vandalismo humorístico não é exactamente humor. Nada disto
tem que ver com limites, muito menos do humor ou da liberdade de expressão, até
porque ninguém espera limites no pensamento de um grunho. Seria insensato
esperar de um grunho que pensasse com inteligência. Se é grunho é precisamente porque
não pensa com inteligência. Os hooligans, por exemplo, pensam com a raiva, com
os músculos, pensam com a vontade de destruir. Tipos que fazem piadas são
apenas isso, tipos que fazem piadas. Mas também podem, em função das piadas que
fazem, levar-nos a pensar que não pensam senão com o intestino grosso,
nomeadamente porque das piadas que fazem ressalta apenas e tão-somente uma
espécie de hooliganismo humorístico. Querem que olhemos para eles pela porcaria
que fazem, nós olhamos, é impossível não olhar, vêem-se por todo o lado. E dizemos olha para estes palhaços, que tristeza de
palhaços. Pobres palhaços.
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